Airbnb em condomínios residenciais: pode proibir?
Sente-se aqui, vamos conversar francamente sobre essa questão que tem tirado o sono de síndicos e investidores imobiliários. Como seu advogado e alguém que já viu muita briga em assembleia de condomínio, preciso te explicar o cenário jurídico atual sem “juridiquês” desnecessário, mas com a precisão técnica que o tema exige. A resposta curta para a sua pergunta é: depende do que diz a lei maior do seu prédio. Mas o buraco é bem mais embaixo e envolve uma análise detalhada sobre o que os nossos tribunais superiores decidiram recentemente.
O cenário mudou drasticamente nos últimos anos com a consolidação das plataformas digitais. Antes, alugar um imóvel por temporada era algo burocrático e restrito a certas épocas do ano. Hoje, com um clique, seu vizinho transforma o apartamento dele em um hotel rotativo. Isso gera um conflito de interesses clássico que nós, do direito, adoramos estudar. De um lado, você tem o proprietário querendo maximizar o lucro. Do outro, a massa condominial querendo paz e segurança. A tensão é evidente e a solução jurídica não é preta e branca.
Você precisa entender que o direito de propriedade não é absoluto. Muita gente chega no meu escritório batendo na mesa e dizendo “o apartamento é meu, faço o que eu quiser”. Não é bem assim, meu caro. Vivemos em coletividade e o Código Civil impõe limites claros. Quando você compra um apartamento em um condomínio estritamente residencial, você assina um contrato social tácito de que manterá aquela destinação. Se a atividade começa a parecer comércio, aí temos um problema jurídico sério chamado desvio de finalidade.
A Jurisprudência do STJ e a Natureza Jurídica do Conflito
O precedente do REsp 1.819.075 e a ratio decidendi
Vamos direto ao ponto nevrálgico da questão. O Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial 1.819.075 e fixou um entendimento que serve de bússola para nós advogados. A Corte decidiu que, se a convenção do condomínio não prevê expressamente a possibilidade de locação por curta temporada via plataformas digitais, a assembleia pode, sim, proibir essa prática. Note que não foi uma proibição geral automática. O tribunal disse que o condomínio tem o poder de vetar se assim decidir.
A ratio decidendi, ou seja, a razão de decidir dos ministros, baseou-se no fato de que a alta rotatividade de pessoas estranhas descaracteriza o conceito de residencialidade. Residência pressupõe moradia, habitualidade, estabilidade. O Airbnb, em muitos casos, traz o oposto disso. Traz a transitoriedade. O STJ entendeu que essa prática se aproxima muito mais de um contrato de hospedagem atípico do que de uma locação residencial tradicional regida pela Lei do Inquilinato.
Isso significa que, se você é um investidor, precisa ler a convenção do condomínio antes de comprar o imóvel. Se a convenção for omissa, você está em um terreno pantanoso, pois uma assembleia futura pode votar pela proibição e o Judiciário, com base nesse precedente, muito provavelmente vai validar a decisão da massa condominial. É um risco jurídico que precisa ser calculado na ponta do lápis antes de qualquer investimento.
A distinção técnica entre locação típica e contrato de hospedagem
Para defender seu caso, seja você a favor ou contra, precisamos distinguir os institutos jurídicos. A locação por temporada existe na Lei 8.245/91 e permite aluguéis de até 90 dias. No entanto, o que acontece nas plataformas digitais muitas vezes foge desse escopo. Quando o proprietário oferece serviços agregados, como lavagem de roupa, café da manhã, limpeza diária ou concierge, ele sai da esfera da locação e entra na esfera da prestação de serviço de hospedagem.
Essa distinção é crucial porque a hospedagem é uma atividade comercial regulada pela Lei Geral do Turismo. E condomínios residenciais, por definição, não podem abrigar atividades comerciais que alterem a rotina do prédio. Se você apenas entrega a chave e recebe o imóvel de volta dias depois, é mais fácil defender que é uma locação por temporada. Mas se você age como um “host” profissional, oferecendo mimos e serviços, você está dando munição para o condomínio alegar atividade comercial irregular.
Eu sempre oriento meus clientes a olharem para a natureza da relação. Há animus de moradia, mesmo que breve, ou há apenas o consumo de um serviço de estadia? A linha é tênue, mas é nessa linha que os juízes decidem. Se houver alta rotatividade, check-in e check-out constantes e uso das áreas comuns como se fosse um resort, a balança da justiça pende para a interpretação de atividade comercial vedada em zona estritamente residencial.
A supremacia da Convenção Condominial e a autonomia da vontade
No direito condominial, a Convenção é a Constituição do prédio. O que está escrito nela tem força de lei entre as partes, o que chamamos de pacta sunt servanda. O STJ reafirmou que a autonomia da vontade dos condôminos, expressa na convenção, deve prevalecer. Se os vizinhos se reuniram e decidiram que não querem Airbnb no prédio, essa vontade coletiva supera o interesse individual de lucro do proprietário.
Isso não quer dizer que a convenção pode tudo. Ela não pode violar direitos fundamentais ou impor regras vexatórias. Mas regular o uso da propriedade para garantir a segurança e o sossego é uma atribuição legítima. Portanto, se a convenção diz “destinação exclusivamente residencial para moradia familiar”, a interpretação atual é que a exploração econômica via plataformas digitais viola essa cláusula.
Você deve entender que a alteração desse documento é o caminho tanto para permitir quanto para proibir. Se a convenção atual é antiga e não fala nada sobre aplicativos, ela dá margem para interpretações. O ideal, para segurança jurídica de todos, é que o assunto seja debatido em assembleia e, se for o caso, a convenção seja atualizada para refletir a vontade da maioria qualificada dos proprietários. A omissão é a mãe dos processos judiciais.
O Embate de Princípios Constitucionais e Civis
O direito de propriedade pleno e suas limitações sociais
Muitos clientes entram na minha sala citando o Artigo 1.228 do Código Civil, que diz que o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa. É verdade. Mas o mesmo código, e principalmente a nossa Constituição Federal, estabelece que a propriedade deve atender à sua função social. O seu direito de propriedade termina onde começa o direito do seu vizinho de não ser incomodado.
Não existe direito absoluto no nosso ordenamento jurídico. O direito de usar o imóvel para obter renda é legítimo, mas ele não pode se sobrepor à segurança da coletividade. Imagine um prédio de alto padrão, estritamente familiar, onde de repente começam a circular dezenas de pessoas desconhecidas toda semana, com acesso a senhas, chaves e áreas de lazer. Isso gera um risco objetivo que limita o seu direito de exploração econômica.
A defesa do proprietário que quer alugar deve focar na ausência de prejuízo. Se ele conseguir provar que seus hóspedes são tranquilos, que não usam as áreas comuns e que a segurança não é afetada, ele fortalece seu argumento. Mas juridicamente, a função social da propriedade em um condomínio é a moradia e a convivência harmônica. Qualquer uso que desvirtue isso pode ser legitimamente restringido pelos demais condôminos.
A tríade da convivência: saúde, sossego e segurança
O Artigo 1.336 do Código Civil é o grande guardião da paz nos condomínios. Ele diz que é dever do condômino não utilizar sua unidade de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes. Esses são os “três Ss” que norteiam qualquer decisão judicial sobre o tema. Quando falamos de Airbnb, o ponto mais atacado é a segurança.
A segurança é o calcanhar de Aquiles das locações de curta temporada. Em um hotel, você tem portaria 24 horas, identificação rigorosa, câmeras em todos os cantos e seguranças profissionais. Em um prédio residencial, muitas vezes a portaria é remota ou feita por um funcionário que conhece os moradores pelo nome. Inserir um fluxo intenso de desconhecidos nesse ambiente fragiliza todo o sistema de proteção do condomínio.
O sossego também é frequentemente afetado. Hóspedes de férias tendem a ter horários e comportamentos diferentes de quem trabalha e mora no local. Festas, barulho de malas arrastando na madrugada, uso indevido da piscina. Tudo isso fere o direito de vizinhança. Como advogado, se eu estou defendendo o condomínio, eu vou bater incessantemente na tecla de que a sua atividade lucrativa está custando a paz de espírito dos meus clientes. E esse argumento tem muita força nos tribunais.
O desvio de finalidade da edificação
Toda edificação tem uma destinação registrada na prefeitura e no cartório de registro de imóveis. Se o prédio foi aprovado como “residencial multifamiliar”, ele foi projetado e dimensionado para isso. O uso de elevadores, o consumo de água, a estrutura das áreas comuns, tudo foi calculado para uma população fixa. Quando você transforma várias unidades em “quartos de hotel”, você sobrecarrega essa infraestrutura.
Esse desvio de finalidade não é apenas uma questão de uso, é uma questão urbanística. Se o prédio passasse a operar como um apart-hotel, ele estaria sujeito a normas de segurança contra incêndio muito mais rígidas, exigências da vigilância sanitária e tributação diferenciada. Ao operar um “hotel disfarçado” dentro de um residencial, o proprietário está, na prática, burlando essas normas técnicas.
O argumento jurídico aqui é o da preservação da natureza do empreendimento. Se você comprou em um residencial, você pagou por um residencial. Transformá-lo em misto ou comercial à revelia dos vizinhos é uma alteração unilateral do contrato de convivência. Por isso, juízes têm sido duros com proprietários que abusam da locação por temporada em prédios que não comportam essa estrutura física e social.
O Processo Legislativo Interno: Alterando a Convenção
O quórum qualificado de dois terços e sua complexidade
Agora vamos para a parte prática, a “engenharia política” do condomínio. Para proibir expressamente o Airbnb na convenção, ou para permiti-lo se a convenção proibir, a lei exige um quórum específico. Estamos falando de votos de dois terços da totalidade das frações ideais. Não é dois terços dos presentes na reunião, é dois terços de todos os donos de apartamentos do prédio.
Conseguir esse número é uma tarefa hercúlea na vida real. Quem vive em condomínio sabe que as assembleias costumam estar vazias. Para atingir esse quórum, é necessário um trabalho de mobilização intenso, procurações e muita conversa de corredor. Se o síndico quer proibir, ele precisa fazer uma campanha. Se não atingir os dois terços, a alteração da convenção não passa e a regra antiga permanece, mantendo a insegurança jurídica.
Muitas vezes, a proibição acaba sendo aprovada apenas no Regimento Interno, que exige quórum simples (maioria dos presentes). Mas aqui mora um perigo jurídico. O Regimento Interno serve para regular o uso das coisas comuns (horário da piscina, coleta de lixo), não para restringir o direito de propriedade. Uma proibição de aluguel feita apenas via Regimento é muito mais fácil de ser derrubada na justiça por um bom advogado do que uma alteração na Convenção.
Regulamento Interno versus Convenção: hierarquia das normas
Você precisa entender a hierarquia das leis dentro do seu condomínio. No topo está a Convenção Condominial, que só perde para as leis federais. Abaixo dela está o Regimento Interno (ou Regulamento Interno). Decisões de assembleia vêm depois. Como eu disse, restringir o uso da propriedade é matéria de Convenção. O Regimento Interno não tem poder para proibir o condômino de alugar seu imóvel.
O que o Regimento Interno pode fazer, e deve fazer, é regular o uso. Por exemplo, o Regimento pode exigir que o proprietário envie a ficha completa dos hóspedes com 24 horas de antecedência. Pode proibir o uso de áreas de lazer (piscina, academia) por inquilinos de curtíssima temporada, alegando que são áreas destinadas aos moradores. Pode estabelecer multas pesadas para barulho.
Essa estratégia de “estrangulamento” via Regimento Interno é muito usada quando não se consegue o quórum de 2/3 para mudar a Convenção. O condomínio não proíbe a locação (porque não pode via Regimento), mas cria tantas regras e restrições burocráticas que a atividade se torna inviável ou pouco atrativa para o proprietário investidor. É uma manobra jurídica astuta que você deve conhecer.
A implementação de travas de segurança e identificação
Independentemente de proibir ou permitir, a segurança deve ser a prioridade. Se o seu condomínio convive com o Airbnb, é imperativo profissionalizar o controle de acesso. Não dá para deixar o porteiro decidindo na hora quem entra e quem não entra. É necessário implementar sistemas de identificação digital, biometria ou reconhecimento facial, se possível.
A regra deve ser clara: sem identificação prévia enviada pelo proprietário, o hóspede não sobe. E o proprietário deve ser responsabilizado por cadastrar essas pessoas. Isso protege o condomínio juridicamente. Se houver um furto ou um problema, há registro de quem estava lá. A negligência nesse controle pode gerar responsabilidade civil para o condomínio, ou seja, o prédio pode ter que pagar indenização se algo der errado por falha na segurança.
Além disso, é recomendável limitar o número de pessoas por unidade. Nada de alugar um estúdio de 30 metros quadrados para oito pessoas dormirem em colchonetes. Isso fere as normas de salubridade e segurança contra incêndio. O síndico tem o dever de fiscalizar isso e aplicar multas se houver superlotação, baseando-se nas normas técnicas de ocupação do edifício.
Aspectos Processuais e Defesa do Proprietário
O ônus da prova e a materialidade do incômodo
Se chegarmos às vias de fato e a situação virar um processo judicial, a questão probatória é fundamental. Se você é o proprietário sendo processado pelo condomínio para parar de alugar, o condomínio tem o ônus de provar que a sua atividade está causando transtorno. Alegações genéricas de “insegurança” não costumam colar com juízes mais técnicos. É preciso provar fatos concretos.
Por outro lado, se você é o síndico ou o vizinho incomodado, precisa documentar tudo. O Livro de Ocorrências é o seu melhor amigo. Registre cada barulho, cada festa, cada vez que um hóspede deixou o portão aberto. Vídeos, áudios e testemunhos de porteiros são essenciais. O juiz não mora no prédio, ele só vai saber o que acontece através das provas que colocarmos nos autos do processo.
A defesa do proprietário geralmente se pauta na demonstração de que ele faz uma triagem rigorosa dos hóspedes e que a locação é esporádica. Já ganhei casos demonstrando que o inquilino de temporada causava menos problemas que o morador fixo do 502 que ouvia som alto todo dia. A materialidade do incômodo é o fiel da balança. Sem prova de dano efetivo aos “3 Ss”, a proibição pode ser vista como abusiva.
A responsabilidade civil objetiva e subjetiva por danos
Vamos falar de dinheiro e reparação. Se o seu hóspede do Airbnb quebrar o espelho do elevador ou vomitar no hall de entrada, adivinha quem paga a conta? Você, o proprietário. A responsabilidade perante o condomínio é sua. Não adianta dizer “ah, cobre dele”. O vínculo jurídico do condomínio é com o condômino. Você paga e depois se vira para cobrar do seu hóspede numa ação de regresso.
A coisa fica mais séria se houver danos a terceiros. Imagine que seu hóspede agrida um vizinho ou cause um vazamento que estrague o apartamento de baixo. A responsabilidade civil aqui pode ser complexa. Você pode ser responsabilizado por “culpa in eligendo” (culpa por ter escolhido mal a quem alugar) ou “culpa in vigilando” (falta de fiscalização).
Por isso, recomendo fortemente aos meus clientes que fazem locação por temporada que tenham um seguro de responsabilidade civil robusto. As plataformas oferecem alguma cobertura, mas leia as letras miúdas. Muitas vezes elas cobrem danos ao seu imóvel, mas são evasivas quanto a danos causados a terceiros nas áreas comuns. Proteja seu patrimônio pessoal contra os atos dos seus inquilinos temporários.
Tutelas de urgência e medidas liminares na prática forense
No mundo jurídico, tempo é dinheiro. Quando o conflito escala, é comum entrarmos com pedidos de “tutela de urgência”, as famosas liminares. Se o condomínio prova que a atividade está colocando a segurança em risco iminente (ex: hóspedes fazendo festas com drogas, ou entrando armados), o juiz pode determinar a suspensão imediata das locações sob pena de multa diária, antes mesmo de julgar o mérito final da causa.
O reverso também acontece. Se o condomínio proíbe você de alugar arbitrariamente, sem base na convenção, podemos pedir uma liminar para garantir o seu direito de alugar até que a questão seja resolvida. Para conseguir isso, precisamos demonstrar o fumus boni iuris (a fumaça do bom direito) e o periculum in mora (o perigo da demora), ou seja, que você está perdendo renda vital para sua subsistência ou pagamento do imóvel.
Essas batalhas de liminares são intensas e definem o rumo do processo. Quem sai na frente com uma liminar favorável tem muito mais poder de barganha para um eventual acordo. Por isso, a estratégia processual inicial deve ser cirúrgica. Não se entra com uma ação dessas de forma aventureira; é preciso ter um dossiê probatório muito bem montado.
O Futuro da Locação por Temporada e Projetos de Lei
O Projeto de Lei 2474/2019 e a possível regulação federal
O Direito não é estático, e o Legislativo está de olho nessa briga. Existe um Projeto de Lei, o PL 2474/2019, que busca alterar a Lei do Inquilinato para permitir expressamente a locação por temporada via aplicativos, proibindo que convenções de condomínio vedem essa prática, salvo se houver quórum qualificado para tal proibição.
Se essa lei passar, o jogo vira. A regra passaria a ser a permissão, e a proibição seria a exceção que exigiria esforço do condomínio. Hoje, a jurisprudência pende para dar poder ao condomínio de proibir. Com a lei, o direito de propriedade ganharia um reforço legislativo federal. É fundamental acompanhar a tramitação desse projeto, pois ele pode anular decisões judiciais anteriores ou mudar completamente a estratégia de defesa.
Isso mostra que estamos em um momento de transição. O legislador brasileiro geralmente demora a reagir às inovações tecnológicas, mas quando reage, cria um novo marco regulatório. Até lá, vivemos sob a égide das decisões dos tribunais, que, como vimos, podem variar dependendo da composição das turmas de julgamento, embora o STJ tenha dado um norte mais restritivo recentemente.
A tributação da atividade e impacto no rateio de despesas
Outro ponto que deve esquentar nos próximos anos é a questão tributária. Hoje, a maioria das pessoas físicas declara isso como aluguel comum no Imposto de Renda. Mas as prefeituras e o fisco federal estão doidos para enquadrar isso como atividade de prestação de serviço, incidindo ISS e outros impostos comerciais. Se isso acontecer, a burocracia aumenta exponencialmente.
Além disso, discute-se se unidades que fazem locação intensiva deveriam pagar uma taxa de condomínio maior. O argumento é justo: se você usa mais a portaria, mais a limpeza, mais a água (se não houver medição individual), você deve pagar mais. Já existem decisões permitindo a cobrança majorada para unidades que exploram atividade comercial ou de alta rotatividade, baseada no princípio de que quem gera mais despesa deve custeá-la.
Fique atento a isso. Uma alteração na convenção pode não proibir o Airbnb, mas pode determinar que unidades destinadas a esse fim paguem 30% ou 50% a mais de condomínio. Isso impacta diretamente a margem de lucro do investidor e é uma forma “econômica” de o condomínio desestimular a prática sem proibi-la explicitamente.
Tendências de “Flex Living” e condomínios mistos
Para finalizar nossa conversa, preciso te alertar sobre o futuro do mercado imobiliário. As construtoras já entenderam o recado. Os novos lançamentos já vêm com a “Convenção preparada”. Vemos o surgimento de prédios mistos, com entradas separadas: uma torre para moradores fixos e outra para short-stay (estadia curta). Ou prédios inteiros desenhados para o modelo de “Flex Living”.
Nesses novos empreendimentos, a proibição não existe porque o modelo de negócio já nasce híbrido. Quem compra para morar lá já sabe que terá alta rotatividade. Isso resolve o conflito na origem. O problema jurídico continuará existindo nos prédios antigos, os condomínios “legado”, onde a mentalidade e a estrutura não foram feitas para a economia compartilhada.
A tendência é a profissionalização. O amadorismo de alugar o quarto de hóspedes vai diminuir, dando lugar a investidores profissionais gerindo carteiras de imóveis em prédios preparados para isso. Se você quer investir, procure esses novos produtos. Se você quer morar em paz, procure condomínios que já tenham se posicionado e blindado sua convenção contra a rotatividade. O segredo é a informação preventiva.
Quadro Comparativo: Modelos de Ocupação
Para que você visualize melhor onde cada coisa se encaixa juridicamente, preparei este quadro comparativo simples:
| Característica | Airbnb (Curta Temporada) | Locação Residencial (Lei 8.245/91) | Hotelaria / Flat (Lei 11.771/08) |
| Finalidade Principal | Mista (Renda/Hospedagem) | Moradia / Residência | Comercial / Hospedagem |
| Tempo de Ocupação | Dias ou Semanas (Alta rotatividade) | Longo prazo (Geralmente 30 meses) | Diárias (Rotatividade máxima) |
| Serviços Inclusos | Variável (Limpeza, Wi-Fi, Enxoval) | Nenhum (Geralmente por conta do inquilino) | Completos (Recepção, camareira, refeições) |
| Regulação Principal | Vácuo legal / Jurisprudência STJ | Lei do Inquilinato | Lei Geral do Turismo |
| Pode Proibir? | Sim, via Convenção (STJ) | Não (Direito de Propriedade) | Não (Natureza do empreendimento) |
| Relação Jurídica | Atípica / Consumo (discutível) | Locador x Locatário | Prestador x Consumidor |
Espero que essa conversa tenha esclarecido o terreno onde estamos pisando. A lei está viva e muda conforme a sociedade muda. O importante é você não agir no escuro. Se for comprar, leia a convenção. Se for síndico, organize a casa. E se tiver dúvida, consulte seu advogado antes de assinar qualquer coisa. A prevenção é sempre mais barata que o processo.
