ChatGPT para Advogados: Como usar IA para pesquisar jurisprudência e resumir acórdãos (com ética)
Sabe aquele frio na barriga que todo mundo sentiu quando o computador substituiu a máquina de escrever nos escritórios de advocacia? Pois é, meu caro colega, estamos vivendo isso de novo. A Inteligência Artificial chegou e, ao contrário do que os profetas do apocalipse jurídico dizem, ela não vai roubar a sua carteira da OAB. Ela veio para tirar de você aquele trabalho braçal e repetitivo que consome as suas madrugadas. Mas, como tudo no Direito, existe o jeito certo e o jeito errado de fazer a coisa. O jeito errado pode te levar a uma representação no Tribunal de Ética; o certo vai te dar tempo para advogar de verdade., ao escolher um Curso Advocacia Estratégica nos Tribunais de 2º Grau e Superiores
Vamos conversar francamente sobre como usar o ChatGPT e ferramentas similares para pesquisar jurisprudência e resumir acórdãos, mantendo a ética em dia e a segurança jurídica intacta. Esqueça os termos técnicos de programação; aqui a conversa é de advogado para advogado.
O Cenário Atual da IA no Direito[1][2][3][4]
A primeira coisa que precisamos alinhar é a expectativa. O ChatGPT não é um juiz, não é um doutrinador e, definitivamente, não é um estagiário que você pode deixar trabalhando sem supervisão. Ele é um modelo de linguagem probabilístico. Trocando em miúdos, ele é excelente em prever qual a próxima palavra que faz sentido em uma frase, mas ele não tem “compromisso com a verdade” da mesma forma que nós temos no processo civil. Ele quer agradar você com uma resposta que pareça correta.
Isso nos leva ao famoso “Caso Avianca” nos Estados Unidos, onde um advogado usou a IA para pesquisar precedentes e a ferramenta inventou casos inteiros, com citações e nomes de juízes que nunca existiram. O advogado não conferiu, peticionou e o resultado foi desastroso. Esse medo das “alucinações” — termo técnico para quando a IA inventa dados — é real e precisa ser gerido. A ferramenta é poderosa, mas exige que você assuma o comando.
Para começar com o pé direito, você precisa configurar sua interação com a máquina.[1] Não adianta abrir o chat e pedir “me dê jurisprudência sobre dano moral”. Você precisa dar contexto. Diga à IA que ela deve atuar como um especialista em Direito Civil Brasileiro, focado em jurisprudência do STJ, por exemplo. Quanto mais específico for o seu comando inicial, menos margem para invenção você deixa. É como despachar com o juiz: se você não for claro no pedido, a liminar não sai.
A Arte de Pesquisar Jurisprudência com IA[2][3][5][6][7][8][9]
Pesquisar jurisprudência no ChatGPT exige uma mudança de mentalidade. Ele não é o Google nem o site do Tribunal de Justiça. Se você pedir “me mostre o acórdão número X”, ele provavelmente vai falhar ou inventar o texto se não tiver acesso à internet em tempo real. A grande sacada aqui é usar a IA para encontrar teses e raciocínios, e não necessariamente o texto literal do julgado num primeiro momento, a menos que você esteja usando uma versão conectada à web (como o Copilot ou ChatGPT Plus com navegação).
A engenharia de prompts — ou seja, a arte de perguntar — é o que separa os amadores dos profissionais. Em vez de pedir julgados aleatórios, peça para a IA estruturar os argumentos vencedores para uma tese de “desvio produtivo do consumidor”, por exemplo. Peça para ela listar quais são as palavras-chave mais usadas pelos ministros do STJ ao negar esse tipo de pedido. Com essas informações mastigadas, você vai ao site oficial do tribunal e faz a busca cirúrgica. A IA serve como uma bússola, não como o mapa do tesouro completo.
E aqui entra a regra de ouro: a verificação cruzada é obrigatória. Nunca, em hipótese alguma, copie e cole uma ementa gerada pela IA direto na sua petição sem antes jogar o número do processo no site do tribunal para ler o original. O ChatGPT pode acertar o entendimento, mas errar o número do Recurso Especial. Trate a informação da IA como uma fofoca de corredor de fórum: pode ser verdade, e é muito útil, mas você só vai usar depois de confirmar nos autos.
Resumindo Acórdãos e Peças Processuais
Se na pesquisa a IA exige cautela, no resumo ela brilha intensamente. Sabe aquele acórdão de 50 páginas que você precisa ler correndo antes da audiência? Copie o texto, jogue na ferramenta e peça um resumo estruturado.[6] Mas não peça qualquer resumo. Oriente a IA para separar o que é o relatório, o que é a fundamentação do voto vencedor e, principalmente, qual foi o dispositivo final.
Uma funcionalidade incrível é pedir para a ferramenta identificar a ratio decidendi, ou seja, a razão central de decidir. Muitas vezes, lemos páginas de obiter dictum (argumentos laterais) e perdemos o fio da meada. A IA consegue limpar esse ruído e te entregar o cerne da questão em segundos. Isso te dá uma vantagem estratégica enorme na hora de preparar um Recurso Especial, onde você precisa demonstrar exatamente onde o tribunal a quo violou a lei federal.
Outra aplicação prática é a “tradução” para o cliente. Nós sabemos que o juridiquês assusta. Você pode pegar a parte dispositiva de uma sentença complexa e pedir: “Reescreva isso em linguagem simples e empática para explicar ao meu cliente via WhatsApp, sem usar termos em latim”. Isso melhora a sua relação com o cliente e evita aqueles telefonemas de dúvida que duram horas. Você humaniza o atendimento usando um robô nos bastidores.
Ética e Responsabilidade Profissional[1][2][3][4][7][8][10]
Agora precisamos falar sério sobre o Código de Ética. O primeiro ponto de atenção é o sigilo. Quando você coloca os dados do seu cliente numa IA genérica e gratuita, você está, tecnicamente, enviando esses dados para um servidor de terceiros que pode usar isso para treinamento do modelo. Jamais coloque nomes, CPFs, valores de causas ou segredos industriais no prompt. Anonimize tudo. Troque “Empresa X” por “Reclamada” e “João da Silva” por “Reclamante”. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) não perdoa, e a responsabilidade pelo vazamento é sua.[10]
Além do sigilo, existe o dever de supervisão.[11] O artigo 34 do Estatuto da Advocacia pune a negligência. Se a IA escrever uma bobagem jurídica e você assinar, a culpa é exclusivamente sua.[10] Não existe a defesa “foi o robô que escreveu”. Você deve encarar a IA como um estagiário muito rápido, mas que às vezes bebe um pouco a mais no almoço. Tudo o que ela produz precisa ser lido, relido e validado por um advogado habilitado.
A transparência também é um valor em ascensão. Alguns juízes já começam a exigir que as partes informem se usaram IA na elaboração das peças. Mesmo que não seja obrigatório na sua jurisdição, é de bom tom ser transparente com seu cliente. Explique que você usa tecnologia para ser mais eficiente e custar menos, mas que a estratégia e a revisão são 100% humanas. Isso agrega valor ao seu serviço, mostrando que seu escritório é moderno e eficiente.
Refinamento da Argumentação Jurídica
Vamos elevar o nível? Use o ChatGPT como um “Advogado do Diabo”. Depois de escrever sua tese inicial, cole-a na ferramenta e dê o seguinte comando: “Atue como um advogado sênior da parte contrária e aponte todas as fragilidades e contra-argumentos possíveis para essa tese”. Você vai se surpreender. A IA vai encontrar buracos na sua lógica que você, apaixonado pela causa, não viu. Isso te permite blindar a petição antes mesmo de protocolar.
Outra forma brilhante de uso é na busca por analogias. Às vezes, o caso é tão novo que não tem jurisprudência específica. Peça para a IA buscar casos similares em outras áreas do Direito ou até em Direito Comparado (como na legislação europeia ou americana, se aplicável). “Como a legislação de proteção de dados da Europa trata esse problema específico?”. Isso pode te dar o insight para criar uma tese inovadora que vai virar precedente no STF daqui a alguns anos.
A estruturação lógica também ganha força. Peça para a IA organizar seus fatos e fundamentos em forma de silogismo (premissa maior, premissa menor e conclusão). Advogados tendem a ser prolixos; a máquina nos força a ser lógicos. Uma petição bem estruturada, onde a conclusão decorre logicamente das premissas, tem muito mais chance de ser lida com carinho por um assessor de juiz sobrecarregado.
Ferramentas Complementares e Integração[1]
Não viva apenas de ChatGPT “puro”. O universo das LegalTechs explodiu. Existem plugins e ferramentas que conectam o poder de raciocínio do ChatGPT a bancos de dados oficiais e atualizados. Isso resolve o problema da alucinação de jurisprudência. Ferramentas que “leem” PDFs gigantes e permitem que você converse com o processo são essenciais para quem lida com volumes grandes de contencioso.
A automação de fluxo é o próximo passo. Imagine integrar a IA ao seu email. Chega uma publicação de intimação, a ferramenta lê, identifica o prazo, sugere a tarefa na sua agenda e ainda rascunha um email para o cliente avisando sobre o andamento. Isso não é ficção científica, já é realidade em muitos escritórios.[2] Você deixa de ser um “gerente de prazos” para voltar a ser um jurista estrategista.
O futuro da advocacia é híbrido. O advogado que nega a tecnologia vai ficar para trás, assim como o que se recusou a usar o computador nos anos 90. Mas o advogado que confia cegamente na tecnologia vai perder a OAB. O segredo está no meio-termo: a tecnologia acelera, mas é a sua experiência, sua ética e seu feeling humano que dirigem o carro.
Comparativo de Ferramentas de Pesquisa
Para te ajudar a visualizar onde cada ferramenta se encaixa no seu dia a dia, preparei este quadro comparativo simples.
| Característica | ChatGPT (Versão Padrão/Plus) | Jusbrasil (Pesquisa Tradicional) | IAs Jurídicas Especializadas (Ex: Harvey/Jurídico AI) |
| Principal Função | Geração de texto, resumo e raciocínio lógico. | Repositório confiável de cópia fiel de julgados. | Análise preditiva e redação com base controlada. |
| Risco de Alucinação | Alto (se não supervisionado).[2] Pode inventar casos. | Nulo. O que está lá é o documento oficial. | Baixo. Treinadas especificamente para não inventar. |
| Criatividade | Alta. Ótimo para teses novas e brainstorming. | Nenhuma. Entrega apenas o que já existe. | Média. Foca na segurança jurídica e formalidade. |
| Custo | Baixo/Médio (Mensalidade acessível). | Variável (Planos de acesso a documentos). | Alto (Geralmente cobrado em dólar ou planos corporativos). |
| Recomendação | Use para resumir, revisar e criar esqueletos de peças.[8] | Use para validar a existência da jurisprudência citada. | Use para escritórios com alto volume e orçamento robusto. |
Doutor, a ferramenta está aí. Use-a com sabedoria, proteja seu cliente e, acima de tudo, mantenha o pensamento crítico afiado. A inteligência é artificial, mas a responsabilidade é toda humana.
