Crimes Tributários (Sonegação): O Guia Definitivo para Blindar seu Patrimônio e sua Liberdade
Advertisement

Seja muito bem-vindo ao meu escritório. Sente-se, por favor. Se você está lendo isso, é provável que tenha recebido uma notificação estranha da Receita Federal, ou talvez esteja apenas preocupado com aquelas “manobras” contábeis que seu primo disse que eram seguras. Como advogado que já viu de tudo nesse tribunal, vou ser franco com você: o Leão não está para brincadeira, e o que você não sabe sobre crimes tributários pode custar muito mais do que dinheiro. Pode custar sua liberdade.

Neste artigo, vamos ter uma conversa séria, mas descomplicada, sobre o que realmente configura a sonegação fiscal, como o Fisco opera hoje em dia (spoiler: eles sabem mais sobre sua conta bancária do que sua esposa ou marido) e como diferenciar um erro honesto de um crime doloso. Vou usar minha experiência de décadas no Direito Penal Tributário para traduzir o “juridiquês” em estratégias práticas que você pode aplicar no seu negócio hoje mesmo.

Esqueça os mitos de que “no Brasil tudo acaba em pizza”. Quando se trata do cofre público, a justiça pode ser lenta, mas ela é implacável. Vamos desvendar juntos a Lei 8.137/90 e entender exatamente onde termina o planejamento tributário inteligente e onde começa o código penal. Prepare seu café e vamos ao que interessa.

O Que é, De Fato, a Sonegação Fiscal?

A sonegação fiscal não é apenas “deixar de pagar imposto”.[1][2][3][4][5][6][7][8][9][10][11] Se fosse assim, metade do empresariado brasileiro estaria preso. Juridicamente, estamos falando de uma conduta muito específica prevista na Lei 8.137 de 1990.[4][7][8][10][12][13] Para que o crime ocorra, é necessário haver fraudeastúcia ou enganação.[13] Você precisa ter a intenção deliberada de impedir que o Estado saiba que um fato gerador de tributo aconteceu. É a mentira contada ao Fisco com o objetivo de suprimir (não pagar nada) ou reduzir (pagar menos) o tributo devido.[1][2][3][5][6][7][8]

No universo do Direito Penal, chamamos isso de “dolo”. É a vontade livre e consciente de praticar o ilícito. Se você simplesmente esqueceu de pagar a guia do DAS ou do DARF no final do mês porque o fluxo de caixa apertou, isso não é sonegação, é inadimplência. A sonegação exige que você ativamente esconda a operação.[5] É o ato de vender sem nota, de calçar a nota (emitir com valor menor), de usar “laranjas” ou de criar despesas fictícias para abater no Imposto de Renda.[5][6]

É fundamental que você entenda que o crime de sonegação fiscal é um crime de resultado (na maioria dos casos do artigo 1º). Isso significa que, para o crime se consumar, o Fisco precisa ter sido efetivamente lesado. Ou seja, o tributo deixou de entrar nos cofres públicos por causa da sua manobra. Enquanto a autoridade fiscal não constituir o crédito tributário de forma definitiva — o que chamamos de lançamento —, não há crime material, conforme a Súmula Vinculante 24 do STF.[3] Mas cuidado: isso não impede investigações preliminares.

A Definição Legal da Lei 8.137/90[3][4][8][10][12][13]

A Lei 8.137/90 é a nossa “bíblia” quando o assunto é crime contra a ordem tributária. O artigo 1º dessa lei elenca as condutas mais graves, punidas com reclusão de 2 a 5 anos.[2][8][13] O legislador foi minucioso ao descrever o que é proibido. O inciso I, por exemplo, fala em “omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias”.[2][6][8][13] Isso cobre desde a omissão de rendimentos na declaração de Ajuste Anual até a falsificação de dados no SPED da sua empresa.

Já o inciso II trata da fraude na fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos ou omitindo operações em documentos ou livros exigidos pela lei fiscal.[2][6][7][12][13][14] Aqui entra aquela velha prática de ter o “Livro Caixa 2”. O empresário mantém uma contabilidade oficial para o governo e uma contabilidade real para os sócios. Essa dualidade é a prova material do dolo, da intenção de fraudar. Quando a fiscalização apreende computadores ou cadernos com anotações paralelas, a defesa fica extremamente complicada.

Além disso, temos o artigo 2º da mesma lei, que traz crimes de menor potencial ofensivo, punidos com detenção. Um exemplo clássico é o de “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”. Isso é muito comum com o ICMS embutido no preço ou o Imposto de Renda retido na fonte do funcionário. Se você descontou do funcionário e não repassou ao governo, você se apropriou de um dinheiro que não era seu. Isso é apropriação indébita tributária.[9]

Exemplos Clássicos do Cotidiano Empresarial

Vamos trazer isso para a realidade do dia a dia. Um exemplo muito comum é a “Nota Fiscal Calçada” ou “Meia Nota”. Você vende um serviço de R

10.000,00,mascombinacomoclientedeemitirumanotadeapenasR10.000,00,mascombinacomoclientedeemitirumanotadeapenasR

 5.000,00 para pagar menos ISS e PIS/COFINS. O cliente paga os outros 5 mil “por fora”. Isso é crime tipificado.[4][6][7][8][10][13] Ambos, quem emite e quem aceita e se beneficia dessa nota falsa, podem ser responsabilizados, pois houve um conluio para lesar o erário.

Outra situação frequente é a confusão patrimonial com despesas pessoais dos sócios. O empresário usa o cartão de crédito da empresa para pagar a escola dos filhos, as compras do supermercado e a viagem de férias, e lança tudo isso na contabilidade como “despesas operacionais” ou “despesas gerais”. Isso reduz artificialmente o lucro da empresa e, consequentemente, o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social (CSLL). O Fisco entende isso como distribuição disfarçada de lucros e sonegação fiscal.

Temos também a compra de “notas frias”. Empresas de fachada, que não existem fisicamente, vendem notas fiscais para que empresas reais possam “esquentar” mercadorias roubadas ou, mais comumente, gerar créditos indevidos de ICMS e IPI. Você compra uma nota de R$ 50.000,00 de insumos que nunca foram entregues, apenas para abater o imposto que você teria a pagar na saída do seu produto. Essa prática é vista como uma das mais graves pelo Ministério Público e costuma resultar em operações policiais com mandados de busca e apreensão.

O Elemento Subjetivo: A Importância do Dolo[13]

Como advogado, sempre explico aos meus clientes: o Direito Penal não pune o incompetente, pune o mal-intencionado. Para haver condenação por sonegação fiscal, o Ministério Público precisa provar o dolo específico. Eles precisam demonstrar que você sabia o que estava fazendo e queria aquele resultado. Se o não pagamento do tributo ocorreu por um erro de cálculo do sistema, uma interpretação equivocada (mas razoável) da lei ou falha humana do contador sem seu conhecimento, não há crime.

A defesa técnica muitas vezes se baseia na tese de “erro de tipo” ou “ausência de dolo”. Imagine que a legislação tributária mudou — o que no Brasil acontece quase diariamente — e sua empresa continuou aplicando a alíquota antiga por engano. Houve prejuízo ao Fisco? Sim. Houve crime? Provavelmente não. Faltou a vontade de fraudar. Nesse caso, resolve-se na esfera administrativa, com o pagamento do imposto, multa e juros, sem processo criminal.

Porém, não tente subestimar a inteligência dos auditores e juízes. O dolo muitas vezes é provado pelas circunstâncias. Se você tem uma estrutura complexa de offshores em paraísos fiscais sem declarar, usa “laranjas” para ocultar patrimônio ou destrói documentos contábeis, é impossível alegar “mero erro”. A reiteração da conduta também é um forte indício. Quem erra uma vez, erra. Quem “erra” todo mês da mesma forma que o beneficia, na verdade, está sonegando.

As Linhas Tênues: Sonegação, Inadimplência e Elisão[5][12]

Você precisa dominar esses três conceitos para dormir tranquilo. A confusão entre eles é a principal causa de problemas jurídicos para empresários. A Sonegação (Evasão Fiscal) é o crime que acabamos de discutir: usar meios ilícitos para não pagar.[2][4][5][7][8][11][12] É o “lado negro da força”. Já a Elisão Fiscal é o “lado luminoso”. É o planejamento tributário lícito.[5][12] É usar a própria lei a seu favor para pagar o menor imposto possível.

A Inadimplência Fiscal, por sua vez, fica no meio do caminho. Ela não é crime (em regra), mas é um problema administrativo sério. Na inadimplência, você declara tudo corretamente. Você diz ao Fisco: “Eu vendi 100 mil, devo 10 mil de imposto, mas não tenho dinheiro para pagar agora”. Você não mentiu. Você não fraudou. Você apenas não pagou. O Estado vai te cobrar, vai protestar seu nome, vai penhorar seus bens, mas não vai te prender (salvo casos específicos de apropriação indébita reiterada e dolosa, que é uma discussão jurisprudencial mais recente).

Entender essa tríade muda sua postura nos negócios. O objetivo de qualquer consultoria jurídica ou contábil de alto nível é maximizar a Elisão (planejamento), evitar a Inadimplência (através de gestão de fluxo de caixa) e eliminar totalmente a Sonegação (risco criminal). Quando você opera na Elisão, você estuda regimes tributários (Simples, Lucro Presumido, Real), aproveita incentivos fiscais regionais e reorganiza a estrutura societária para eficiência fiscal. Tudo dentro da lei, tudo às claras.

Inadimplência Fiscal: Dever Não é Crime[4][12]

Quero reforçar este ponto porque vejo muito desespero desnecessário. O simples inadimplemento tributário não gera prisão.[4] A Constituição Federal proíbe a prisão por dívidas civis (exceto pensão alimentícia). Se sua empresa quebrou e você ficou devendo milhões em tributos declarados, você vai enfrentar uma Execução Fiscal. O Procurador da Fazenda vai tentar bloquear suas contas (Bacenjud), seus carros (Renajud) e seus imóveis. É uma dor de cabeça civil e comercial.

No entanto, a linha pode ser cruzada se a inadimplência for usada como estratégia de negócio. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu recentemente que o “devedor contumaz” — aquele que cobra o imposto do cliente, declara, mas nunca repassa ao Estado, usando esse dinheiro como capital de giro para vender mais barato que a concorrência — pode, sim, ser enquadrado criminalmente. A lógica é que ele não está apenas devendo, ele está fraudando a concorrência e se apropriando de valor de terceiros de forma sistemática.[6]

Portanto, se você está passando por uma dificuldade financeira real, a melhor estratégia é declarar tudo. Entregue as declarações acessórias (DCTF, GIA, SPED) com os valores reais. Isso prova sua boa-fé. Mostra que você não está escondendo nada. Quando o dinheiro entrar, você parcela a dívida. O crime nasce da ocultação, não da falta de dinheiro. A transparência é o seu melhor escudo contra uma acusação penal.

Elisão Fiscal: A Arte de Pagar Menos Legalmente[5][11]

A elisão fiscal é o direito sagrado do contribuinte. Ninguém é obrigado a gerir seus negócios da forma mais cara para si e mais lucrativa para o governo. O planejamento tributário envolve análise prévia.[13] Antes do fato gerador ocorrer, você estrutura a operação. Por exemplo, você pode escolher abrir uma holding para administrar seus imóveis e pagar cerca de 11% a 14% de tributos sobre os aluguéis, em vez de pagar 27,5% na Pessoa Física. Isso é elisão.[5][12] É inteligente e totalmente legal.

Outro exemplo de elisão é a escolha geográfica. Se uma cidade oferece uma alíquota de ISS de 2% para seu serviço e outra cobra 5%, mudar a sede da sua empresa para a cidade mais barata (desde que você realmente opere lá) é uma estratégia válida. O problema — e onde a elisão vira evasão — é a simulação. Se você abre um escritório virtual numa cidade vizinha só para pagar menos imposto, mas toda a sua estrutura e funcionários continuam na cidade cara, isso é fraude. Isso é sonegação simulada de planejamento.

O limite da elisão fiscal é o que chamamos de “propósito negocial”. As estruturas que você cria precisam ter uma razão de ser econômica além da mera economia de impostos. Se você cria uma teia de empresas que não têm função operacional nenhuma, apenas para triangular notas e reduzir a carga tributária, o Fisco pode desconsiderar esses negócios jurídicos e autuar você por sonegação, aplicando multas qualificadas de até 150%.

Quadro Comparativo: Entenda as Diferenças

Para facilitar sua visualização, preparei um quadro comparativo direto. Imagine que estamos analisando três empresários diante da mesma obrigação fiscal.

CaracterísticaSonegação Fiscal (Crime)Inadimplência Fiscal (Dívida)Elisão Fiscal (Planejamento)
Ação PrincipalOmitir, mentir, fraudar documentos ou usar “laranjas”.[1][2][3][4][5][6][7][8][12][13][14]Declarar corretamente, mas não pagar a guia no vencimento.Estruturar o negócio antes da operação para reduzir a carga.
Intenção (Dolo)Má-fé. Intenção clara de enganar o Fisco.Boa-fé (geralmente). Dificuldade financeira ou desorganização.Estratégia lícita. Busca por eficiência econômica.
Consequência LegalProcesso Crime (Lei 8.137/90), prisão e multas pesadas (75% a 150%).Execução Fiscal (cobrança de bens), multa de mora (20%) e juros.Nenhuma penalidade. Economia legal de recursos.[12]
Risco de PrisãoAlto (Pena de 2 a 5 anos de reclusão).[8][11]Nulo (exceto apropriação indébita contumaz).Zero.
Exemplo PráticoVender mercadoria sem emitir nota fiscal.Emitir a nota, declarar a dívida, mas não pagar o boleto.Escolher o regime do Lucro Presumido em vez do Real após estudo.

Penas, Consequências e a Realidade do Processo

Você precisa saber que a pena para a sonegação fiscal clássica (Art.[2][6][8][13] 1º da Lei 8.137/90) é de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa.[8][13] “Reclusão” significa que o regime inicial pode ser o fechado ou semiaberto, dependendo da pena total e dos antecedentes. Não é como os crimes menores punidos com “detenção”, que raramente dão cadeia. Aqui a coisa é séria. E não pense que ser réu primário garante impunidade; garante apenas melhores condições processuais.

Além da liberdade, o impacto financeiro é devastador. A multa punitiva do Fisco é, em regra, de 75% sobre o valor do imposto não pago. Se houver prova de fraude evidente (dolo), essa multa sobe para 150%. Imagine dever R

1milha~odeprincipal.ComamultaqualificadaeosjurosSELICacumulados,essadıˊvidaviraR1milha~odeprincipal.ComamultaqualificadaeosjurosSELICacumulados,essadıˊvidaviraR

 3 milhões num piscar de olhos. Isso quebra qualquer empresa.

E tem as consequências “invisíveis”. Quem responde a processo por crime tributário perde a idoneidade fiscal. Sua empresa fica impedida de participar de licitações públicas. O acesso a crédito bancário é cortado, pois o compliance dos bancos detecta o risco jurídico. Seus bens pessoais podem ser bloqueados cautelarmente para garantir o pagamento da dívida futura. É uma morte civil lenta para o empresário.

Quem Vai Preso? O Sócio ou o Contador?

Essa é a pergunta de um milhão de dólares. A regra geral do Direito Penal é a responsabilidade pessoal. Responde pelo crime quem, de fato, ordenou ou praticou a conduta. Historicamente, os sócios-administradores (aqueles que constam no contrato social como administradores) são os primeiros alvos. O Ministério Público tende a denunciar o dono da caneta. A defesa “eu não sabia de nada, foi meu contador” raramente cola se você é o beneficiário direto do dinheiro sonegado.

No entanto, o contador não está imune. Se ficar provado que o profissional da contabilidade agiu em conluio, criou as estratégias fraudulentas, vendeu “facilidades” ou falsificou livros por conta própria, ele responde como coautor do crime. Em muitos casos, vemos denúncias contra o empresário e o contador juntos. A ética profissional e a blindagem contratual são essenciais aqui. Um bom contador não aceita fazer “mágica”, e um bom empresário não pede.

Existem também casos de responsabilização de diretores financeiros e gerentes que tinham poder de gestão e decisão sobre os tributos. A teoria do “domínio do fato” é muito usada: quem tinha o poder de mandar fazer ou mandar parar o crime? Essa pessoa será a ré no processo. Por isso, a governança corporativa clara, definindo responsabilidades, é vital para grandes empresas.

Prisão Preventiva e Operações Policiais

Não precisamos esperar a condenação final para ver os efeitos drásticos da sonegação. O Brasil vive a era das grandes operações policiais. Delegacias especializadas em crimes fazendários atuam em conjunto com o Ministério Público e a Receita. É comum vermos prisões preventivas decretadas no início da investigação para “garantia da ordem pública” ou para impedir a destruição de provas.

Imagine a cena: 6 da manhã, a Polícia Federal na sua porta, apreendendo computadores, celulares e arquivos. A notícia vaza para a imprensa. A reputação da sua marca é destruída em minutos. Mesmo que você seja absolvido anos depois, o dano à imagem é muitas vezes irreversível. Clientes fogem, fornecedores cortam prazos. O processo penal é, em si, uma pena.[2]

A prisão preventiva é usada quando há indícios de que o grupo criminoso continua atuando, dissipando patrimônio para não pagar a dívida ou ameaçando testemunhas. Para o advogado de defesa, reverter uma preventiva nesses casos exige demonstrar que o empresário tem residência fixa, colabora com as investigações e que o risco de fuga ou reiteração não existe.

Como o Fisco Pega Você: A Era do Big Data

Se você ainda acha que a fiscalização depende de um auditor ir fisicamente à sua empresa olhar papéis, você está em 1990. Hoje, a fiscalização é eletrônica, massiva e impulsionada por inteligência artificial. A Receita Federal do Brasil possui um dos sistemas de cruzamento de dados mais avançados do mundo. O computador deles “conversa” com o computador do banco, do cartório, da administradora de cartão de crédito e até de imobiliárias.

O projeto SPED (Sistema Público de Escrituração Digital) mudou o jogo. Hoje, você envia nota fiscal eletrônica (NF-e), escrituração contábil digital (ECD), escrituração fiscal digital (EFD) e e-Financeira. O Fisco recebe a informação em tempo real. Antes mesmo de você fechar o mês, eles já sabem quanto você vendeu, quanto comprou e qual é a margem de lucro esperada para o seu setor. Se os números fugirem do padrão, o alerta vermelho acende automaticamente no sistema da Receita (o famoso sistema “T-Rex” e seus sucessores).

O cruzamento mais letal é entre a movimentação financeira e a renda declarada. A e-Financeira obriga os bancos a informarem movimentações globais dos clientes. Se sua empresa declarou faturamento de R

50mil,masmovimentouR50mil,masmovimentouR

 500 mil na conta bancária, você caiu na malha fina de Pessoa Jurídica. Não há como explicar essa discrepância sem confessar a omissão de receita.

Inteligência Artificial e Cruzamento de Dados

A Inteligência Artificial da Receita agrupa contribuintes por setor econômico e região. Ela sabe qual é a média de consumo de energia elétrica de uma padaria do seu tamanho. Se você declara metade do faturamento da média, mas consome a mesma energia, o sistema aponta a anomalia: “provável venda sem nota”. O mesmo vale para compras de cartão de crédito. Se as vendas no cartão superam o faturamento total declarado, a sonegação é matemática e a autuação é eletrônica.

Outra fronteira é o rastreamento de patrimônio a descoberto. As redes sociais viraram fonte de prova. O empresário declara que ganha um salário mínimo, mas posta fotos em viagens internacionais na primeira classe e com carros de luxo. Softwares de monitoramento captam esses sinais exteriores de riqueza e cruzam com a Declaração de IRPF. A incompatibilidade gera fiscalização imediata.

Até as transações com criptomoedas estão no radar através da Instrução Normativa 1.888. As Exchanges são obrigadas a reportar as operações. A ideia de que bitcoin é um porto seguro para dinheiro não declarado caiu por terra para quem opera em corretoras nacionais ou grandes internacionais que colaboram com governos. O cerco se fechou digitalmente.

O Papel das Denúncias e Colaboradores

Apesar de toda a tecnologia, o fator humano ainda é relevante. Grande parte das investigações criminais começa com uma denúncia anônima ou identificada. E quem denuncia? Ex-funcionário demitido, ex-sócio brigado, ex-cônjuge após divórcio litigioso ou concorrente desleal. O “fogo amigo” é a maior causa de abertura de inquéritos policiais por crimes tributários.

Existe também a figura do “Whistleblower” (denunciante do bem), incentivada em legislações modernas. Em grandes fraudes estruturadas, o Ministério Público utiliza a colaboração premiada. Um funcionário menor ou um sócio minoritário entrega o esquema em troca de perdão judicial ou redução de pena. Se você tem um “esqueleto no armário”, saiba que qualquer pessoa que saiba dele é uma bomba relógio em potencial.

Defesa e a “Bala de Prata”: Extinção da Punibilidade[8][10]

Agora, a boa notícia. O crime tributário tem uma peculiaridade que o difere de um homicídio ou roubo: o objetivo do Estado não é te prender, é arrecadar. O governo quer o dinheiro. Por isso, a legislação brasileira oferece uma “ponte de ouro” para o sonegador arrependido. O pagamento integral do débito tributário, a qualquer tempo (mesmo após a condenação, segundo entendimentos mais recentes e benéficos, embora a regra segura seja antes do trânsito em julgado), extingue a punibilidade.

Isso significa que, se você pagar o que deve (imposto + multas + juros), o processo criminal morre. O juiz tranca a ação, sua ficha continua limpa e você não vai preso. Essa é a “bala de prata” da defesa. É por isso que, muitas vezes, a estratégia defensiva é ganhar tempo para que o cliente consiga levantar capital e parcelar ou quitar a dívida. O parcelamento do débito também suspende a ação penal enquanto você estiver pagando as parcelas em dia.

Mas atenção: não brinque com o parcelamento. Se você parcelar apenas para suspender o processo e parar de pagar depois, a ação penal volta a correr de onde parou. E aí o juiz não será tão simpático. O pagamento é a confissão da dívida, então, uma vez feita a opção por pagar para se livrar do crime, não há como discutir depois que o imposto não era devido.

Teses de Defesa Técnica

Quando o pagamento não é uma opção (porque a dívida é impagável ou porque o cliente jura que é inocente), entramos com as teses de defesa técnica no processo penal. A principal delas é a negativa de autoria ou ausência de dolo, como já conversamos. Tentar provar que o erro foi contábil, e não criminoso. Provar que você agiu amparado por uma consultoria que garantiu a legalidade da operação (erro de proibição).

Outra tese forte é a nulidade da prova. Se a Receita Federal obteve seus dados bancários sem autorização judicial (em períodos onde isso era debatido) ou se a quebra de sigilo foi excessiva, podemos tentar anular as provas. No Direito, se a árvore está envenenada, os frutos também estão. Provas ilícitas anulam o processo todo.

Há também a discussão sobre a inexigibilidade de conduta diversa. Em situações extremas, o empresário alega que tinha que escolher entre pagar o imposto ou pagar os salários dos funcionários para que eles não passassem fome. Embora os tribunais superiores sejam duros com essa tese, em casos de crises graves e comprovadas, ela pode sensibilizar o julgador, especialmente para afastar a culpabilidade ou reduzir a pena.

A Necessidade de Especialistas[5]

Enfrentar uma acusação de crime tributário não é para amadores. Você não chama um ortopedista para fazer uma cirurgia cardíaca. Da mesma forma, não deve chamar o advogado cível da empresa ou o advogado da família para cuidar de um crime contra a ordem tributária. É um nicho que exige conhecimento profundo de Direito Tributário (para discutir o imposto) e de Direito Penal e Processual Penal (para discutir a liberdade).

Um advogado especialista vai atuar em duas frentes: na esfera administrativa (tentando derrubar a autuação na Receita ou no CARF) e na esfera judicial (no inquérito policial ou na ação penal). Muitas vezes, conseguimos anular o débito na esfera administrativa, o que faz o crime desaparecer automaticamente, pois sem tributo não há sonegação.

Portanto, meu conselho final de amigo e advogado: previna-se. Invista em compliance tributário.[1][2][3][5][9][12][13][14] Audite suas contas antes que a Receita o faça.[9] Mas se a notificação chegar, não se desespere. Procure ajuda especializada imediatamente. O silêncio ou a defesa errada na primeira fase podem ser fatais. O jogo é duro, mas com as cartas certas, é possível proteger seu patrimônio e, o mais importante, sua liberdade.

Deixe seu comentário

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Facebook Twitter Instagram Linkedin Youtube