Inventário com Testamento: O Caminho das Pedras para a Via Extrajudicial
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Inventário com Testamento: O Caminho das Pedras para a Via Extrajudicial[1][2][3][4][5][6][7][8]

Muitas famílias ainda acreditam que a existência de um testamento é uma sentença de prisão a um processo judicial que se arrastará por décadas. Essa visão, embora fundamentada em um passado burocrático, não reflete mais a realidade dinâmica do Direito Sucessório brasileiro atual. Se você é herdeiro ou está planejando sua sucessão, precisa saber que as portas dos cartórios não estão mais trancadas para quem deixou sua última vontade expressa em papel. A agilidade que você busca pode estar a um passo de distância, desde que saiba manobrar as regras com inteligência.

O cenário mudou drasticamente nos últimos anos graças a uma interpretação mais humana e funcional das leis superiores. Antigamente, o sistema tratava o testamento como algo tão complexo que exigia a vigilância constante de um juiz do início ao fim da partilha. Hoje, entendemos que se a família está de acordo e o testamento é claro, não há motivo para o Estado intervir na divisão do patrimônio. Você, como cidadão, tem o direito de resolver a vida financeira de seus entes queridos sem depender da morosidade do Poder Judiciário.

Neste artigo, vamos conversar francamente, como se estivéssemos em uma reunião aqui no escritório, sobre como você pode utilizar a via extrajudicial mesmo havendo testamento. Vamos desmistificar o “medo do juiz”, entender os custos envolvidos e traçar a rota mais segura para que o patrimônio deixado seja transferido aos herdeiros com a menor dor de cabeça possível. Prepare-se para entender o Direito não como um obstáculo, mas como uma ferramenta de solução.[3]

A Evolução Jurídica: Do Travamento Judicial à Liberdade do Cartório

O que dizia a letra fria da lei (CPC/2015)

O Código de Processo Civil de 2015, em seu artigo 610, trouxe uma redação que, à primeira vista, pareceu um balde de água fria em quem buscava agilidade. A lei dizia expressamente: “Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial”.[2][7][8] Essa frase curta criou, por anos, uma barreira quase intransponível nos tabelionatos de notas pelo Brasil afora. A interpretação literal levava os tabeliães a negarem a abertura de inventários extrajudiciais assim que a certidão negativa de testamento apontava uma disposição positiva.

A intenção original do legislador, embora conservadora, tinha um propósito de proteção. A ideia era garantir que a vontade do falecido (o de cujus, como chamamos no direito) fosse cumprida rigorosamente, sob a fiscalização do Ministério Público e do magistrado. O receio era de que, no ambiente privado do cartório, os herdeiros pudessem ignorar legados ou disposições específicas do testador. Por conta desse temor, milhares de processos simples, onde todos concordavam com tudo, entupiram as varas de família e sucessões sem necessidade real de litígio.

No entanto, essa “proteção” acabou gerando um efeito colateral perverso: o prejuízo financeiro e emocional aos herdeiros. O tempo de um processo judicial corrói o patrimônio. Imóveis ficam fechados deteriorando-se, contas bancárias ficam travadas sem render juros adequados e veículos desvalorizam na garagem. A letra fria da lei, ao tentar proteger a vontade do morto, acabava punindo os vivos com a ineficiência estatal. Felizmente, o Direito é uma ciência viva e a interpretação dos tribunais começou a mudar essa realidade estagnada.

A virada de jogo com o entendimento do STJ[1]

A grande mudança de paradigma ocorreu quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ), especificamente através da 3ª e da 4ª Turma, começou a analisar casos onde a burocracia judicial não fazia o menor sentido. O entendimento que se consolidou, exemplificado no Recurso Especial 1.808.767, foi de que a legislação não deve ser lida apenas pelo que está escrito, mas pelo objetivo que ela busca atingir. Os ministros entenderam que se o testamento é válido e os herdeiros são maiores e capazes, não há conflito que justifique a intervenção do Estado-Juiz na partilha.[1][8]

Essa decisão funcionou como uma chave mestra abrindo as portas dos cartórios. O STJ definiu que o inventário judicial obrigatório serve para proteger incapazes (menores de idade ou interditados) ou para resolver brigas entre herdeiros. Se não há incapazes e não há briga, a obrigatoriedade cai por terra. O tribunal superior validou a tese de que a via extrajudicial é perfeitamente viável, desde que se cumpra uma etapa preliminar de validação do testamento.[2] Foi uma vitória da autonomia da vontade das partes contra o formalismo excessivo.

Para você, isso significa que o precedente existe e deve ser usado. Advogados experientes hoje já não aceitam a negativa do cartório baseada apenas na leitura do artigo 610 do CPC. Nós utilizamos essa jurisprudência para fundamentar o pedido de inventário em cartório. É importante notar, contudo, que nem todos os cartórios aceitam isso de imediato sem a devida fundamentação legal, por isso a importância de estar bem assessorado juridicamente para “forçar” essa porta que o STJ já destrancou.

A lógica da desjudicialização e o benefício direto para a família

O movimento de “desjudicialização” é a tendência moderna de retirar do Poder Judiciário tudo aquilo que não envolve conflito real. Pense comigo: o juiz existe para decidir quem tem razão quando duas pessoas discordam. Se todos os herdeiros concordam que a casa da praia fica com o filho João e o apartamento da cidade com a filha Maria, e isso respeita o testamento, por que um juiz precisaria “carimbar” essa decisão? A desjudicialização devolve ao cidadão a responsabilidade e a liberdade de gerir seus bens.

O benefício para a família é imensurável e se traduz principalmente em tempo. Enquanto um inventário judicial com testamento pode levar, sem exagero, de três a dez anos dependendo da vara e da complexidade, a via extrajudicial (após a fase de registro do testamento) pode ser resolvida em questão de semanas ou poucos meses. Isso permite que os herdeiros tenham acesso rápido aos recursos para pagar as próprias despesas do funeral, os impostos e seguir com suas vidas.

Além do tempo, há o fator custo-benefício emocional. Processos judiciais longos tendem a gerar atritos familiares que não existiam no início. O desgaste de anos recebendo intimações e despachos incompreensíveis pode azedar relações entre irmãos. No cartório, o ambiente é de resolução. Resolve-se tudo em uma ou duas assinaturas, vira-se a página do luto e inicia-se a gestão do patrimônio herdado. A desjudicialização não é apenas uma medida de economia processual para o Estado, é uma medida de saúde mental para a sua família.

Os Requisitos Inegociáveis para o Procedimento Híbrido

A plena capacidade e a concordância absoluta dos herdeiros[1][2][8][9]

Para trilhar esse caminho mais rápido, o primeiro requisito é inflexível: todos os herdeiros devem ser maiores de 18 anos e mentalmente capazes. Se houver um único herdeiro menor de idade ou interditado judicialmente, a via extrajudicial está bloqueada. O Estado entende que precisa fiscalizar a partilha para garantir que o menor não seja passado para trás pelos adultos. Nesse caso, infelizmente, o processo terá que ser integralmente judicial, com a participação obrigatória do Ministério Público.

O segundo pilar é a concordância.[5][10] Não pode haver sequer uma vírgula de discordância sobre a partilha. Se um irmão acha que o carro vale mais do que a tabela FIPE e o outro não aceita, ou se há dúvida sobre quem fica com as joias da família, o tabelião não pode lavrar a escritura. O cartório é local de homologar acordos, não de julgar disputas. Você e seus familiares precisam chegar ao tabelionato já com a divisão definida. Se houver briga, o tabelião suspende o ato e remete as partes para as vias ordinárias (o tribunal).

É comum que, no momento do luto, antigas mágoas venham à tona. Por isso, meu conselho prático é realizar reuniões prévias apenas entre os herdeiros para alinhar as expectativas antes de iniciar o procedimento. O consenso é a “moeda de troca” que vocês pagam para ter a agilidade do cartório. Vale a pena ceder em pequenos detalhes para ganhar anos de vida evitando um processo judicial. A concordância deve ser unânime; basta um herdeiro insatisfeito para travar todo o sistema extrajudicial.

A obrigatoriedade e o papel estratégico do advogado[4][6][10]

Você não pode pisar no cartório para fazer um inventário sem um advogado. A lei exige a presença desse profissional em todos os atos de lavratura de escritura pública de inventário. E não se engane achando que o advogado está lá apenas para assinar o papel (o que chamamos pejorativamente de “advogado de assinatura”). A responsabilidade dele é imensa, pois ele garante que a partilha respeita as leis de sucessão, evitando nulidades futuras que poderiam custar muito caro para desfazer.

No contexto de inventário com testamento, o advogado é o arquiteto da estratégia.[10] É ele quem vai conduzir a fase judicial prévia (que explicaremos a seguir) e depois levar a autorização para o cartório. Além disso, o advogado tributarista ou especialista em sucessões vai calcular o ITCMD (imposto sobre herança) para evitar que a família pague mais do que deve, ou que pague multas por atraso. Um bom profissional desenha o plano de partilha para minimizar a incidência de ganho de capital na futura venda dos bens.

Existe a possibilidade de todos os herdeiros contratarem um único advogado, o que barateia os custos e facilita a comunicação, ou cada herdeiro ter o seu próprio representante. Na prática, para o inventário extrajudicial fluir, recomendo fortemente um advogado comum a todos.[4] Isso alinha os interesses e evita o “telefone sem fio” entre patronos diferentes. Lembre-se: o advogado é quem traduz o “juridiquês” do testamento para a realidade prática da divisão de bens.

A Ação de Abertura, Registro e Cumprimento de Testamento (O “Pulo do Gato”)[1][2][9]

Aqui reside o segredo que viabiliza tudo: o procedimento não é 100% extrajudicial. Ele é híbrido. Antes de ir ao cartório dividir os bens, é necessário promover uma ação judicial específica chamada “Ação de Abertura, Registro e Cumprimento de Testamento”.[9] Não se assuste com o nome. Diferente de um processo de inventário, essa ação é muito mais rápida e simples.[4][11] O objetivo dela não é dividir bens, mas apenas validar se o testamento cumpre os requisitos formais (se não tem rasuras, se as testemunhas eram válidas, etc.).

Funciona assim: seu advogado entra com o pedido ao juiz, apresentando o testamento e a certidão de óbito. O juiz vai ouvir o Ministério Público e, se tudo estiver certo, vai declarar que o testamento é válido e ordenar seu registro. O “pulo do gato” é pedir, nessa mesma ação, que o juiz autorize expressamente a realização do inventário pela via extrajudicial.[5] Com a sentença em mãos dizendo “Cumpra-se o testamento”, você tem o alvará necessário para bater na porta do cartório.

Sem essa etapa prévia, o tabelião não pode agir. O cartório precisa da segurança de que um juiz já olhou para aquele documento de última vontade e disse que ele é legal. Essa ação costuma levar poucos meses, em comparação aos anos de um inventário judicial completo. É um pequeno pedágio processual que paga a viagem rápida na autoestrada do extrajudicial. Portanto, quando dizemos “inventário em cartório com testamento”, leia-se: validação rápida no juiz + partilha rápida no cartório.

O Passo a Passo Prático no Cartório de Notas[6]

A escolha do tabelião e a nomeação do inventariante[4][6][11]

Superada a fase judicial de abertura do testamento, você tem liberdade total para escolher o Cartório de Notas. Diferente do processo judicial, que é preso ao local do último domicílio do falecido ou onde estão os bens, o inventário extrajudicial pode ser feito em qualquer tabelionato do Brasil. Você pode escolher aquele cartório perto do seu trabalho, ou aquele onde o tabelião é de confiança da família. Essa flexibilidade logística é uma vantagem enorme, especialmente para herdeiros que moram em cidades diferentes.

O primeiro ato formal será a nomeação do inventariante.[6][11] Embora na via extrajudicial todos assinem juntos, a figura do inventariante ainda é necessária para representar o espólio (o conjunto de bens) perante bancos, Detran e Receita Federal enquanto a escritura não fica pronta. Geralmente, nomeia-se o cônjuge sobrevivente ou o filho mais velho, mas a família tem liberdade para escolher quem tiver mais aptidão administrativa. O inventariante será o responsável por fornecer os documentos e pagar as taxas iniciais.[6]

É importante que o inventariante tenha organização e transparência. Ele receberá a chave do cofre, por assim dizer. No cartório, a nomeação é feita na própria escritura, mas em alguns casos, pode-se fazer uma escritura prévia de nomeação de inventariante apenas para que ele possa movimentar contas para pagar o imposto, por exemplo. Converse com seu advogado sobre a necessidade dessa medida preliminar caso a família não tenha liquidez imediata.

O levantamento de ativos, passivos e o pagamento do ITCMD[6][10]

Com o inventariante definido, começa a fase de “botar as cartas na mesa”. É preciso listar tudo: saldos bancários, investimentos, imóveis, veículos, joias, obras de arte e, muito importante, as dívidas. O inventário deve pagar as dívidas do falecido antes de distribuir o que sobrar aos herdeiros. O advogado fará a busca de certidões negativas de débitos fiscais (Municipais, Estaduais e Federais). Se houver dívida ativa, ela precisa ser quitada ou garantida para que o inventário prossiga.

Após levantar o patrimônio líquido, chega o momento mais doloroso para o bolso: o pagamento do ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação). A alíquota varia de estado para estado no Brasil, podendo chegar a até 8% sobre o valor de mercado dos bens. Atenção aqui: o cartório não aceita o valor venal do IPTU como base de cálculo na maioria das vezes; usa-se o valor de referência de mercado. É preciso ter dinheiro em caixa para pagar essa guia, pois sem o comprovante de pagamento do imposto, a escritura não é assinada.

Muitas famílias travam nessa etapa por falta de liquidez. O falecido deixou imóveis valiosos, mas pouco dinheiro em conta. Nesses casos, o planejamento jurídico é vital.[4] Pode-se tentar pedir um alvará para venda de um bem antes do fim do inventário (mais difícil no extrajudicial) ou os herdeiros rateiam o custo do imposto para depois serem ressarcidos com a venda dos bens. O cálculo correto do imposto é crucial, pois erros podem gerar multas pesadas da Secretaria da Fazenda anos depois.

A lavratura da Escritura Pública de Inventário e Partilha[1][2][3][4][5][6][7][8][10][11]

Esta é a linha de chegada. Com o testamento validado pelo juiz, os bens listados, as dívidas checadas e o imposto pago, o tabelião redige a minuta da Escritura Pública. Esse documento é o “formal de partilha” da via extrajudicial. Todos os herdeiros e os advogados devem ler a minuta com atenção redobrada. Verifique nomes, números de documentos, descrição dos bens e, principalmente, se a divisão dos quinhões está correta conforme o acordado e conforme o testamento.

No dia marcado, todos comparecem ao cartório para assinar o livro notarial. É um ato solene, mas rápido. Se algum herdeiro não puder comparecer (mora fora do país, por exemplo), ele pode enviar uma procuração pública específica dando poderes para outra pessoa assinar em seu nome. Após as assinaturas, o tabelião emite a Escritura Pública de Inventário e Partilha.[2] Esse papel tem força de sentença judicial.

Com a escritura em mãos, o trabalho do advogado ainda não acabou, mas o processo de inventário sim. Agora começa o registro: você leva a escritura ao Cartório de Registro de Imóveis para passar as casas para o nome dos herdeiros, ao Detran para transferir os carros e ao banco para sacar os valores. A escritura é a chave que abre todas essas portas. O ciclo se encerra com a averbação da transferência da propriedade, efetivando a vontade do testador e o direito dos herdeiros.[11]

Riscos e Cautelas na Sucessão Testamentária

O perigo matemático: invadindo a legítima dos herdeiros necessários

Um dos maiores riscos ao se fazer um inventário com testamento, seja judicial ou extrajudicial, é descobrir que o testador “errou na conta”. Pela lei brasileira, se a pessoa tem herdeiros necessários (descendentes, ascendentes ou cônjuge), ela só pode dispor livremente de 50% do seu patrimônio. Os outros 50% pertencem, por lei, a esses herdeiros (a chamada “legítima”). Se o testamento tenta doar 60% ou 70% dos bens para um amigo ou para apenas um dos filhos, o testamento invade a legítima.

Isso gera a necessidade de redução das disposições testamentárias. O advogado terá que recalcular tudo para ajustar a vontade do morto aos limites da lei. No inventário extrajudicial, isso precisa ser feito com consenso absoluto. Se o herdeiro beneficiado pelo testamento não aceitar a redução para respeitar os 50% dos demais, o consenso quebra e o caso vai para a briga judicial. É fundamental verificar matematicamente se o valor dos bens legados cabe dentro da parte disponível do patrimônio.

Cláusulas restritivas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade

Muitos testadores, na ânsia de proteger o patrimônio da família, inserem cláusulas que gravam os bens. A inalienabilidade impede que o herdeiro venda o bem; a impenhorabilidade impede que o bem seja tomado por dívidas; e a incomunicabilidade impede que o bem se misture com o patrimônio do cônjuge do herdeiro. Embora pareçam ótimas proteções, elas podem se tornar um pesadelo logístico para quem recebe a herança.

Para o inventário extrajudicial, essas cláusulas não impedem o procedimento, mas exigem atenção no registro de imóveis posterior. Além disso, o Código Civil atual exige que o testador justifique a “justa causa” para impor essas restrições sobre a legítima. Se o testamento for antigo (antes de 2002) ou não tiver essa justificativa clara, pode ser necessário uma ação judicial própria para “derrubar” essas cláusulas e liberar os bens, o que atrasa a finalização da venda de um imóvel herdado, por exemplo.

Testamentos caducos ou revogados: quando o papel não vale mais nada[2]

Nem todo testamento encontrado na gaveta é válido. Existe o risco do testamento estar caduco (quando o beneficiário morreu antes do testador ou o bem deixado não existe mais) ou revogado (quando o testador fez um testamento mais novo anulando o anterior). A busca na Central de Testamentos (CENSEC) é obrigatória para verificar qual é o “último e definitivo” ato de vontade.

Se for descoberto que o testamento caducou, a sucessão volta a ser “legítima” (segue a ordem da lei, como se não houvesse testamento).[7] O problema surge quando a família inicia o procedimento achando que vai seguir uma regra e descobre no meio do caminho que o documento não tem eficácia. Isso muda a partilha e pode gerar conflitos que inviabilizam a via extrajudicial.[1] A análise prévia da validade e eficácia do testamento pelo advogado é a primeira medida de cautela antes de gastar com custas judiciais de abertura.

Planejamento Sucessório: Alternativas ao Testamento

Doação em vida com reserva de usufruto

Se você quer evitar que seus filhos passem por todo esse trâmite (mesmo o extrajudicial tem seus custos), a doação em vida é uma alternativa robusta. Aqui, você transfere a propriedade dos imóveis para os herdeiros ainda em vida, mas mantém o “usufruto”, ou seja, o direito de morar, alugar e receber a renda do imóvel até sua morte. Na prática, você continua “dono” economicamente, mas a propriedade formal já é dos filhos.

A grande vantagem é que, no dia do falecimento, não é necessário fazer inventário desses bens.[1] Basta levar a certidão de óbito ao registro de imóveis para “dar baixa” no usufruto e a propriedade plena se consolida nas mãos dos herdeiros automaticamente. O custo tributário (ITCMD) costuma ser pago no momento da doação, o que evita surpresas futuras com aumento de alíquotas, além de resolver a partilha enquanto você ainda está presente para arbitrar conflitos.

Holding Familiar: profissionalizando a herança[4]

Para famílias com patrimônio mais robusto, a criação de uma Holding Familiar pode ser muito mais eficiente que um testamento. Em vez de deixar bens (casas, fazendas, ações) para pessoas físicas, você cria uma empresa, transfere os bens para ela e doa as cotas da empresa para os herdeiros. Tudo é regido por um Acordo de Sócios, onde você define regras de sucessão, administração, bloqueio de entrada de genros/noras, e distribuição de lucros.

A Holding evita o inventário quase completamente, pois a titularidade dos bens não muda (continua sendo da empresa), o que muda são os sócios. Além disso, há vantagens tributárias enormes na locação e venda de imóveis dentro da pessoa jurídica em comparação com a pessoa física. É uma estrutura que demanda manutenção contábil, mas oferece uma proteção patrimonial e uma sucessão muito mais organizada e “blindada” contra litígios.

Previdência Privada (VGBL) como instrumento de liquidez imediata

O VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre) não entra em inventário. Essa é a regra de ouro. Ele tem natureza de seguro e, portanto, o saldo é pago diretamente aos beneficiários indicados na apólice, sem passar pela partilha e, em muitos estados, sem incidência de ITCMD (embora isso esteja sendo discutido judicialmente em alguns locais).

Isso faz do VGBL uma ferramenta perfeita para prover liquidez imediata. Enquanto o inventário (mesmo o extrajudicial) leva alguns meses para liberar o dinheiro das contas bancárias travadas, o VGBL cai na conta do beneficiário em até 30 dias após o óbito. Esse dinheiro serve para pagar as custas do próprio inventário, o funeral e as despesas da família durante o período de transição. Funciona como um “colchão de segurança” sucessório extremamente eficaz quando combinado com outras ferramentas.

Quadro Comparativo de Procedimentos

Para que você visualize as diferenças e tome a melhor decisão, preparei este quadro comparando o produto que discutimos (Extrajudicial com Testamento) com as outras duas vias comuns.

CaracterísticaInventário Judicial (Tradicional)Inventário Extrajudicial com Testamento (Híbrido)Inventário Extrajudicial sem Testamento (Padrão)
Local de RealizaçãoFórum (Poder Judiciário)Fórum (apenas abertura) + Cartório de NotasApenas Cartório de Notas
Tempo Estimado1 a 5 anos (ou mais)3 a 6 meses (média)1 a 3 meses
CustoAlto (Custas processuais + Advogado + Tempo)Médio (Custas iniciais judiciais + Emolumentos cartório)Menor (Apenas emolumentos cartório + Advogado)
Pré-requisitosNenhum (obrigatório se houver incapaz/litígio)Herdeiros capazes, consenso + Ação de Abertura préviaHerdeiros capazes e consenso absoluto
FlexibilidadeBaixa (segue ritos rígidos processuais)Alta (escolha do cartório e horários)Altíssima (resolução imediata)
SigiloProcessos costumam ser públicos (salvo segredo de justiça)Escritura é pública, mas o trâmite é discretoEscritura pública, trâmite discreto

Entender essas nuances coloca você no controle da situação. O testamento não é mais uma âncora que prende a família ao judiciário, mas sim um mapa de navegação que, se usado com a técnica correta trazida pelo STJ, permite uma travessia segura e ágil. Converse com seu advogado e avalie se o seu caso se enquadra nessa modalidade híbrida. O seu patrimônio e a paz da sua família agradecem.

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