Os 5 Erros Fatais que barram seu Recurso Especial na origem (e como evitá-los)
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Você já sentiu aquela frustração gelada ao receber uma decisão da Vice-Presidência do Tribunal de Justiça negando seguimento ao seu Recurso Especial. É uma sensação comum na vida do advogado militante, mas que pode ser evitada com técnica apurada e estratégia cirúrgica. A advocacia nos Tribunais Superiores não é apenas uma extensão do contencioso de massa ou uma “terceira instância” para chorar as mágoas de uma derrota na Apelação. O Superior Tribunal de Justiça possui uma missão constitucional muito específica, que é a de uniformizar a interpretação da lei federal, e não a de resolver a injustiça do seu caso concreto isoladamente., ao escolher um Curso Advocacia Estratégica nos Tribunais de 2º Grau e Superiores

Muitos colegas tratam o Recurso Especial como uma nova Apelação, e é exatamente aí que o jogo é perdido antes mesmo de começar. A barreira de admissibilidade na origem, feita pelo Tribunal local, funciona como um filtro impiedoso que retém a vasta maioria dos recursos. Compreender a mecânica desse filtro é o primeiro passo para garantir que sua voz seja ouvida pelos Ministros em Brasília. Se você não dominar as regras do jogo processual estrito, seu brilhante argumento de mérito jamais será lido por quem tem o poder de decidir.

Neste artigo, vamos conversar francamente sobre os equívocos técnicos que mais derrubam recursos na origem. Vou compartilhar com você a visão de quem analisa esses processos e como você deve moldar sua petição para escapar das armadilhas processuais, conhecidas no jargão forense como a “jurisprudência defensiva” do STJ. Prepare seu café, abra seu Vade Mecum mental e vamos dissecar a anatomia de um Recurso Especial vencedor.

O Fantasma do Reexame de Provas (A Súmula 7)

Entendendo a natureza do STJ como Corte de Precedentes

Você precisa internalizar que o Superior Tribunal de Justiça não é uma corte de revisão de fatos, mas sim uma Corte de Precedentes destinada a proteger a integridade do direito federal. Quando você pede ao Tribunal para “verificar que a testemunha mentiu” ou que “o laudo pericial estava errado”, você está convidando o Ministro a reexaminar o caderno probatório, o que é terminantemente vedado nesta instância. A função do STJ é dizer o que a lei significa, e não se o João atravessou o sinal vermelho ou não. Essa distinção é a base de tudo e ignorá-la é o caminho mais rápido para o não conhecimento do seu recurso.

A Súmula 7 do STJ é, sem dúvida, a campeã de incidência nas decisões de inadmissibilidade, pois os advogados insistem em discutir a justiça da decisão baseada na prova dos autos. Para o STJ, a “verdade dos fatos” é aquela soberanamente delineada pelo Tribunal de Justiça ou pelo TRF no acórdão recorrido. Se o Tribunal de origem disse que houve dano moral, para o STJ houve dano moral. O que você pode discutir é se, diante desse fato imutável, a lei federal foi aplicada corretamente ou se o valor fixado foge dos padrões de razoabilidade, mas nunca discutir a existência do fato em si.

A mentalidade que você deve adotar ao redigir seu recurso é a de um acadêmico analisando um caso hipotético, onde as premissas fáticas são inalteráveis. O seu recurso deve partir da premissa de que tudo o que o Desembargador disse sobre os fatos é verdade, mas a conclusão jurídica que ele tirou desses fatos viola um artigo de lei federal. Essa mudança de chave mental é difícil para quem está emocionalmente envolvido com a causa e com a injustiça sofrida pelo cliente, mas é essencial para a técnica recursal excepcional.

A linha tênue entre revaloração jurídica e reexame fático

Existe uma diferença sutil, porém crucial, que pode salvar seu recurso da vala comum da Súmula 7, que é a distinção entre reexame de provas e revaloração jurídica dos fatos. O reexame ocorre quando você pede para o tribunal olhar novamente as provas para mudar a conclusão sobre o que aconteceu. Já a revaloração jurídica acontece quando você aceita a descrição dos fatos feita pelo acórdão, mas demonstra que o tribunal qualificou juridicamente esses fatos de maneira errada. É a luta contra o erro de tipificação ou de enquadramento legal, e não contra a prova.

Imagine um caso em que o tribunal descreve que o réu xingou o autor em uma reunião privada, mas conclui que isso não gera dano moral. Se você recorrer dizendo “mas a testemunha X disse que foi humilhante”, é Súmula 7. Agora, se você disser “Excelências, o acórdão reconhece que houve xingamento (fato incontroverso no acórdão), mas violou o artigo 186 do Código Civil ao dizer que xingamento não é ato ilícito”, isso é revaloração jurídica. Você está discutindo a consequência legal de um fato estabelecido, o que é perfeitamente cabível em Recurso Especial.

Dominar essa técnica de revaloração exige que você trabalhe estritamente com o quadro fático desenhado no acórdão recorrido, sem tentar adicionar elementos externos. Você deve pegar as próprias palavras dos Desembargadores e usá-las como alavanca para demonstrar o erro de direito. É um exercício de contenção, onde você abandona parte da retórica persuasiva fática para focar na lógica jurídica pura.

Como narrar os fatos sem atrair a vedação da súmula

A forma como você constrói a narrativa dos fatos na sua petição de Recurso Especial envia sinais imediatos para o assessor que fará a admissibilidade. Se você começa transcrevendo depoimentos, colando fotos do acidente ou trechos de laudos técnicos, você está acenando uma bandeira vermelha gigante pedindo a aplicação da Súmula 7. A narrativa dos fatos no REsp deve ser sucinta e focada exclusivamente no que ficou decidido no acórdão recorrido, pois é apenas isso que importa para a Corte Superior.

Você deve utilizar expressões como “conforme delineado no acórdão recorrido” ou “segundo a moldura fática do tribunal de origem”. Isso demonstra ao julgador que você respeita a soberania das instâncias ordinárias e que seu pleito é estritamente de direito. Evite frases como “a prova dos autos demonstra inequivocamente” ou “basta ver o documento de fls. X”, pois essas construções denunciam a intenção de reexaminar o conjunto probatório.

O segredo é blindar sua petição contra a interpretação de que você quer uma terceira chance de provar seu ponto. Ao limitar sua narrativa aos fatos que o Tribunal a quo aceitou como verdadeiros, você força o STJ a enfrentar a tese jurídica. Se o Tribunal de origem errou na apreciação da prova, infelizmente, o Recurso Especial não é o remédio para curar essa ferida, e insistir nisso é gastar tempo e dinheiro do seu cliente em uma aventura jurídica sem futuro.

A Ilusão do Prequestionamento Fictício

A diferença entre prequestionamento numérico e temático

O prequestionamento é talvez o requisito mais mal compreendido pelos advogados, gerando uma quantidade massiva de inadmissões. Muitos acreditam que basta citar o artigo de lei na petição inicial ou na apelação para que o requisito esteja cumprido, o que chamamos de prequestionamento numérico. No entanto, o STJ exige o prequestionamento temático, ou seja, que a matéria jurídica, a tese em discussão, tenha sido efetivamente debatida e decidida pelo Tribunal de origem no acórdão recorrido.

Não adianta você gritar o número do artigo de lei em todas as suas peças se o Desembargador, ao julgar a apelação, não emitiu juízo de valor sobre aquela norma específica. O Tribunal Superior precisa saber qual foi a interpretação dada pela corte local para poder dizer se ela está certa ou errada. Se o tribunal local silenciou sobre o tema, não existe “causa decidida” naquele ponto para o STJ revisar, faltando assim a competência constitucional para atuar.

Você deve buscar no acórdão o enfrentamento da tese. Se o acórdão diz “não se aplica o artigo X por tal motivo”, ótimo, está prequestionado. O problema surge quando o acórdão ignora seu argumento. Nesse caso, a mera oposição de Embargos de Declaração pode não ser suficiente se o tribunal persistir na omissão e você não tomar a medida processual correta na sequência, que veremos a seguir.

O erro de confiar cegamente no Artigo 1.025 do CPC

O Código de Processo Civil de 2015 trouxe no artigo 1.025 a figura do prequestionamento ficto, criando uma falsa sensação de segurança na advocacia. A norma diz que se consideram incluídos no acórdão os elementos suscitados nos embargos de declaração, ainda que estes sejam rejeitados. O advogado lê isso e pensa: “Basta eu opor embargos mencionando o artigo omitido e, se rejeitarem, o artigo 1.025 me salva”. Ledo engano, pois a jurisprudência do STJ criou uma barreira interpretativa para a aplicação desse dispositivo.

Para que o STJ admita o prequestionamento ficto, ele precisa reconhecer que realmente houve omissão no tribunal de origem. Isso significa que, no seu Recurso Especial, você não pode apenas alegar a violação do artigo de mérito (ex: artigo do Código Civil); você deve, obrigatoriamente, alegar também a violação do artigo 1.022 do CPC, sustentando que o acórdão recorrido é nulo por negativa de prestação jurisdicional.

Se você não alegar a violação ao artigo 1.022 do CPC, o STJ entende que você aceitou o acórdão como ele está (sem a análise da matéria) e, portanto, aplica a Súmula 211, dizendo que falta prequestionamento. O prequestionamento ficto do artigo 1.025 só “ativa” se o Ministro concordar que o tribunal de origem deveria ter falado sobre o assunto e não falou. É uma “chave” que só gira se você usar o segredo correto na interposição do recurso.

A estratégia correta nos Embargos de Declaração prévios

A batalha pelo Recurso Especial começa muito antes da sua interposição, especificamente no momento em que você redige os Embargos de Declaração contra o acórdão da Apelação. Esses embargos não podem ser genéricos; eles devem ter o propósito específico de forçar o tribunal a se manifestar sobre os dispositivos legais que servirão de base para o seu futuro Recurso Especial. Você deve pedir expressamente que a Corte se pronuncie sobre a incidência do artigo “X” da lei federal “Y”.

Ao redigir esses embargos, seja educado mas incisivo, demonstrando que a omissão sobre aquele ponto legal impede o acesso às instâncias superiores. Se o tribunal rejeitar os embargos com frases padrão como “o julgador não está obrigado a responder a todos os argumentos”, você terá em mãos a prova cabal da negativa de prestação jurisdicional. Isso fundamentará seu capítulo preliminar no Recurso Especial sobre a nulidade do acórdão.

Lembre-se de que os Embargos de Declaração para fins de prequestionamento não têm intuito protelatório, conforme a Súmula 98 do STJ. Portanto, não tenha medo de multa se você estiver agindo de boa-fé para cumprir um requisito de admissibilidade recursal. A estratégia é: provoque o tribunal sobre a tese jurídica; se ele responder, ótimo (prequestionamento real); se ele se calar, alegue nulidade no REsp (prequestionamento ficto via violação do art. 1.022).

A Deficiência de Fundamentação (A Súmula 284)

O perigo da argumentação genérica e dos “artigos em bloco”

A Súmula 284 do STF, aplicada por analogia no STJ, é o pesadelo dos recursos mal escritos. Ela barra o recurso quando a deficiência na fundamentação não permite a exata compreensão da controvérsia. Um erro clássico é citar uma lista enorme de artigos de lei no cabeçalho do recurso e, no corpo do texto, fazer uma dissertação jurídica genérica sobre “justiça” e “equidade”, sem vincular cada argumento a um dispositivo legal específico violado.

O STJ exige uma vinculação dialética precisa. Você não pode dizer “o acórdão violou os artigos 1º, 5º e 10º da Lei tal” e depois escrever três páginas misturando tudo. Você deve ter um tópico para explicar como o artigo 1º foi violado, outro tópico para o artigo 5º e assim por diante. Jogar artigos “em bloco” faz com que o Ministro não consiga identificar qual comando normativo foi desrespeitado pela decisão recorrida em cada ponto específico.

Essa prática de “atirar para todo lado” na esperança de que algum artigo cole demonstra falta de técnica e irrita o julgador. A precisão cirúrgica é valorizada. É preferível escolher um ou dois artigos fortes, cuja violação seja evidente e direta, do que listar dez artigos de forma superficial. A fundamentação deficiente é aquela que deixa para o julgador o trabalho de adivinhar onde está o erro, e o STJ não faz esse trabalho por você.

A necessidade de demonstrar como o acórdão violou a lei

Não basta dizer que o acórdão violou a lei; você tem que demonstrar o “como”. O Recurso Especial é um recurso de fundamentação vinculada. Isso significa que você deve construir um silogismo claro: a premissa maior é o texto da lei federal, a premissa menor é o que o acórdão decidiu, e a conclusão é a contradição entre os dois. Se você apenas transcreve a lei e depois transcreve o acórdão, sem fazer a ponte lógica que demonstra a incompatibilidade, seu recurso é deficiente.

Você deve explicar explicitamente: “O artigo X determina a conduta A. O acórdão recorrido, contudo, validou a conduta B, negando vigência ao comando legal”. Essa clareza textual é indispensável. Muitas vezes, o advogado se perde em citações doutrinárias longas e esquece de fazer esse confronto direto entre a norma e a decisão. A doutrina ajuda, mas ela é acessória; o protagonista do seu recurso é a lei federal violada.

Além disso, verifique se o artigo de lei citado realmente possui comando normativo capaz de infirmar a conclusão do acórdão. Citar artigos que trazem princípios vagos ou definições genéricas muitas vezes atrai a Súmula 284, pois eles, por si sós, não são suficientes para derrubar a fundamentação específica construída pelo tribunal local. O dispositivo legal deve ser pertinente e ter força para alterar o resultado do julgamento.

A correta indicação das alíneas do permissivo constitucional

O artigo 105, III, da Constituição Federal prevê as hipóteses de cabimento do Recurso Especial nas alíneas “a” (contrariar lei federal), “b” (ato de governo local contestado em face de lei federal) e “c” (dissídio jurisprudencial). Você deve indicar expressamente na peça de interposição em qual alínea seu recurso se funda. A falta dessa indicação, ou a indicação errada, gera a inadmissibilidade pela Súmula 284.

Se você fundamenta seu recurso apenas na alínea “a”, não pode, no meio do texto, começar a falar de divergência jurisprudencial sem ter indicado a alínea “c” e cumprido seus requisitos. Da mesma forma, se você indica a alínea “c”, mas não faz o cotejo analítico, o recurso cai. A coerência entre o fundamento constitucional invocado e o desenvolvimento das razões recursais é monitorada com rigor.

É um erro formal bobo, mas fatal. No preâmbulo da sua petição, deixe claro: “interpõe Recurso Especial com fundamento no art. 105, III, alíneas ‘a’ e ‘c’ da Constituição Federal”. E certifique-se de que, no corpo da peça, existem capítulos dedicados a sustentar cada uma dessas alíneas. A organização formal da peça reflete a clareza de raciocínio do advogado e facilita a vida de quem faz a admissibilidade.

A Falha na Demonstração do Dissídio Jurisprudencial

Por que apenas colar ementas é fatal para o recurso

Se você acha que basta encontrar um julgado de outro tribunal que decidiu diferente do seu caso, copiar a ementa (o resumo do julgado) e colar na petição, pare agora. Esse é o erro mais primário na interposição pela alínea “c”. O STJ rejeita sistematicamente recursos que fazem apenas a transcrição de ementas, pois ementas são resumos que muitas vezes não refletem as particularidades fáticas do caso.

A ementa pode parecer idêntica ao seu caso, mas o inteiro teor do acórdão pode revelar que as circunstâncias eram diferentes. O STJ exige que você prove que os casos são idênticos ou muito semelhantes nos fatos, e que a solução jurídica dada foi diametralmente oposta. A simples “guerra de ementas” não comprova a divergência necessária para a admissão do Recurso Especial, pois não demonstra a similitude fática.

O advogado preguiçoso que apenas joga jurisprudência no texto sem trabalhá-la está condenando seu cliente ao insucesso. A demonstração do dissídio é um trabalho artesanal de comparação, que exige leitura atenta dos inteiros teores dos acórdãos paradigmas e do acórdão recorrido. Sem esse trabalho de aprofundamento, a divergência não é caracterizada tecnicamente.

A técnica do cotejo analítico e da similitude fática

O “cotejo analítico” é a expressão chave aqui. Você deve construir uma tabela ou parágrafos comparativos onde coloca, lado a lado, os trechos do acórdão recorrido e os trechos do acórdão paradigma (de outro tribunal ou do próprio STJ) que descrevem os fatos. Você deve dizer: “No caso recorrido, o fato foi X e a decisão foi Y. No caso paradigma, o fato foi idêntico a X, mas a decisão foi Z”. Essa demonstração visual e textual é obrigatória.

Você precisa provar a similitude fática. Não adianta comparar um caso de dano moral por negativação indevida com um caso de dano moral por atraso de voo, mesmo que a tese jurídica seja parecida. Os fatos bases devem ser equivalentes para que a divergência de interpretação da lei fique evidente. O STJ é muito rígido com isso para evitar a comparação de “laranjas com bananas”.

Além de transcrever os trechos, você deve argumentar sobre essa similitude. Dedique um capítulo do seu recurso exclusivamente para o dissídio, explicando didaticamente onde reside a identidade de situações e a contradição de resultados. Se você facilitar a visualização da divergência para o assessor, suas chances de admissibilidade aumentam exponencialmente.

Cuidados ao escolher o acórdão paradigma

A escolha do paradigma é estratégica. Você não pode usar acórdão do mesmo tribunal que proferiu a decisão recorrida (Súmula 13 do STJ), pois a função do REsp é uniformizar a lei federal entre diferentes tribunais do país. Divergências internas do mesmo tribunal devem ser resolvidas por Incidente de Assunção de Competência ou Embargos de Nulidade, não via REsp.

Também evite usar acórdãos muito antigos ou que já foram superados por entendimentos mais recentes (Súmula 83 do STJ). Se o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência atual do STJ, não adianta trazer um paradigma antigo que diz o contrário; seu recurso não vai subir. Verifique sempre se o paradigma escolhido ainda reflete o entendimento dominante ou se é um caso isolado.

Por fim, lembre-se de juntar a certidão de julgamento ou o inteiro teor do acórdão paradigma, ou citar o repositório oficial (Diário da Justiça, site do tribunal) com a URL e data de acesso. A falha na comprovação formal da existência e do teor do paradigma também leva à inadmissibilidade. A forma aqui é tão importante quanto o conteúdo.

O Não Esgotamento das Instâncias Ordinárias

A armadilha das decisões monocráticas no Tribunal local

O Recurso Especial só cabe contra decisões de “única ou última instância” proferidas por Tribunal. Isso significa que ele deve atacar um acórdão (decisão colegiada, de um grupo de juízes). Se o seu recurso de Apelação foi julgado monocraticamente pelo Relator (sozinho), você não pode interpor Recurso Especial direto dessa decisão. Isso é um erro grosseiro que demonstra desconhecimento da hierarquia recursal.

Muitas vezes, o Relator decide monocraticamente com base no artigo 932 do CPC. O advogado, afoito para chegar a Brasília, interpõe o REsp imediatamente. O STJ, ao receber isso, aplica a Súmula 281 do STF por analogia e não conhece do recurso. Você pulou uma etapa essencial: o esgotamento da jurisdição colegiada dentro do tribunal de origem.

O caminho correto, diante de uma decisão monocrática desfavorável no TJ ou TRF, é interpor o Agravo Interno (ou Agravo Regimental) para levar a questão à Turma ou Câmara. Somente após o julgamento desse Agravo Interno, quando houver um acórdão assinado pelo colegiado, é que nasce a oportunidade para o Recurso Especial.

A obrigatoriedade dos Embargos ou Agravo Interno na origem

Mesmo quando há um acórdão, verifique se ainda cabem recursos ordinários com efeito suspensivo ou modificativo na origem. Se o acórdão foi omisso, contraditório ou obscuro, os Embargos de Declaração são obrigatórios não só para o prequestionamento, mas para esgotar a instância. Tentar subir para o STJ deixando “pontas soltas” no tribunal de baixo é fatal.

A lógica do sistema é que o STJ não deve atuar enquanto o Tribunal local ainda puder corrigir ou integrar sua própria decisão. A jurisdição ordinária deve ter dito sua última palavra, de forma completa e definitiva. Se você deixa de opor embargos sobre um ponto crucial, o STJ pode entender que aquela matéria precluiu e não pode mais ser discutida.

Essa exigência visa impedir que o STJ seja sobrecarregado com questões que poderiam ter sido resolvidas localmente. Portanto, antes de pensar no REsp, pergunte-se: “Ainda existe alguma forma de reverter ou esclarecer isso aqui mesmo no TJ?”. Se a resposta for sim, use esse recurso primeiro.

A Súmula 281 do STF aplicada analogicamente ao STJ

A Súmula 281 do STF diz que é inadmissível o recurso extraordinário quando couber, na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada. O STJ aplica o mesmo raciocínio. Isso reforça a necessidade de exaurir todas as possibilidades recursais horizontais (dentro do mesmo grau de jurisdição) antes de tentar o salto vertical para a Corte Superior.

Isso inclui ficar atento às particularidades dos regimentos internos dos tribunais locais. Em alguns casos específicos, podem caber embargos infringentes (hoje técnica do art. 942, mas em situações de leis especiais ainda pode haver debate) ou outros recursos regimentais. O advogado deve mapear todo o iter processual local.

O não esgotamento é um erro de procedimento objetivo. Não há argumentação de mérito que salve um REsp interposto prematuramente. É como tentar sair de uma sala sem abrir a porta; você vai bater de cara na parede da admissibilidade. Certifique-se de que a porta da instância ordinária foi devidamente fechada e trancada antes de seguir viagem.

A Técnica da Dialeticidade Recursal

O princípio da dialeticidade aplicado às Cortes Superiores

O princípio da dialeticidade exige que todo recurso dialogue diretamente com os fundamentos da decisão recorrida. Nas Cortes Superiores, essa exigência é elevada à máxima potência. Você não pode simplesmente ignorar o que o Desembargador escreveu e repetir sua tese inicial. Você deve atacar, ponto por ponto, os alicerces do acórdão. Se o acórdão se manteve em pé por três fundamentos autônomos e você derruba apenas dois, o recurso não sobe (Súmula 283 do STF).

A petição recursal deve ser um espelho reverso da decisão. Para cada argumento que o juiz usou para negar seu direito, deve haver um contra-argumento específico no seu recurso explicando por que aquele fundamento viola a lei federal. É um debate técnico, quase cirúrgico. Se você deixa um fundamento do acórdão sem ataque, ele preclui e, sendo suficiente para manter a decisão, contamina todo o recurso.

Muitos advogados escrevem recursos como se estivessem falando sozinhos, sem considerar o texto do acórdão. Isso é fatal. O STJ quer saber por que o raciocínio do Desembargador está errado, e não apenas por que você acha que está certo. A diferença parece pequena, mas é o que define a dialeticidade.

O erro mortal da repetição de argumentos da Apelação

A prática do “Recorta e Cola” da Apelação para o Recurso Especial é uma epidemia que assola o judiciário. O advogado pega a peça de Apelação, muda o endereçamento para “Ministros do STJ” e protocola. Isso é um suicídio processual. A Apelação foi feita para contestar a Sentença; o Recurso Especial é feito para contestar o Acórdão. São decisões diferentes, com fundamentos diferentes.

Quando você repete a Apelação, você geralmente está discutindo fatos e provas (Súmula 7) e ignorando os novos argumentos jurídicos que surgiram no julgamento colegiado. O STJ considera que a mera repetição das razões da apelação, sem a impugnação específica dos fundamentos do acórdão, fere o princípio da dialeticidade e atrai a Súmula 284 por deficiência de fundamentação.

Você deve redigir uma peça nova, do zero. Claro que a tese de direito é a mesma, mas a roupagem e o foco devem mudar. O alvo agora é o acórdão. Leia o acórdão com uma caneta marca-texto, identifique os pontos nodais da decisão e construa seu recurso atacando esses pontos. Mostre que você leu a decisão e que está irresignado com aqueles argumentos específicos.

A impugnação específica de todos os fundamentos da decisão

Essa regra vale tanto para o Recurso Especial quanto para o Agravo em Recurso Especial (AREsp) que você vai interpor se o REsp for inadmitido. A Súmula 182 do STJ diz que é inviável o agravo que não ataca especificamente os fundamentos da decisão agravada. Essa lógica permeia todo o sistema recursal excepcional.

Se o acórdão disse que seu direito prescreveu e, além disso, que não houve prova do dano, você tem que recorrer da prescrição E da falta de prova. Se você recorrer só da prescrição e “esquecer” da falta de prova, o acórdão se mantém de pé pelo segundo fundamento. O STJ não vai analisar seu recurso porque, mesmo que você tenha razão na prescrição, você perderia pela falta de prova que não foi contestada.

A técnica correta é fazer um checklist dos fundamentos da decisão recorrida e garantir que cada um deles recebeu um tópico de impugnação na sua petição. Não deixe nada passar. O silêncio sobre um ponto fundamentador é interpretado como aceitação tácita, selando o destino do seu recurso.

O Novo Filtro da Relevância da Questão Federal

O impacto prático da Emenda Constitucional 125

A Emenda Constitucional 125/2022 introduziu no Recurso Especial um requisito que antes era exclusivo do Recurso Extraordinário no STF: a relevância. Agora, não basta provar que a lei federal foi violada; você deve provar que essa violação ultrapassa os interesses subjetivos das partes e tem relevância jurídica, política, social ou econômica. O objetivo é desafogar o STJ, transformando-o definitivamente em uma Corte de Teses.

Embora a regulamentação infraconstitucional desse filtro ainda esteja em debate, o texto constitucional já está valendo e os advogados mais precavidos já devem incluir um capítulo preliminar sobre a relevância em seus recursos. Ignorar essa mudança é arriscar que seu recurso seja barrado por falta desse novo pressuposto de admissibilidade, assim que o STJ começar a aplicar o filtro com força total.

Essa mudança aproxima o REsp da Repercussão Geral do STF. O STJ deixará de julgar casos “menores” ou que afetam apenas aquela briga de vizinhos específica, para focar em casos que criam precedentes para a sociedade. Seu papel como advogado é mostrar que o seu caso é esse caso paradigmático.

Como arguir a relevância na petição de interposição

Você deve criar um tópico destacado na sua petição, logo no início, intitulado “Da Relevância da Questão Federal”. Nesse tópico, você vai defender por que aquele caso merece a atenção da Corte Superior. Use argumentos consequencialistas: mostre o impacto econômico daquela tese para o setor, o número de processos similares suspensos esperando essa definição ou a insegurança jurídica que a decisão recorrida está causando no mercado.

Não use argumentos genéricos como “é relevante porque meu cliente foi injustiçado”. A relevância é objetiva. Fale sobre o efeito multiplicador da demanda, sobre a necessidade de pacificação social ou sobre a vultosa quantia envolvida que pode quebrar uma empresa importante. Você precisa vender a ideia de que julgar o seu recurso é um serviço que o STJ presta à nação, e não apenas ao seu cliente.

Pense como um Ministro: “Por que eu deveria gastar meu tempo precioso com esse processo entre milhares?”. A resposta a essa pergunta é o conteúdo do seu capítulo de relevância. Seja persuasivo e use dados, se possível, para demonstrar a magnitude do problema jurídico.

As hipóteses constitucionais de presunção de relevância

A própria Emenda 125 trouxe casos onde a relevância é presumida, ou seja, você não precisa fazer tanto esforço argumentativo porque a Constituição já diz que é relevante. São eles: ações penais, ações de improbidade administrativa, ações cujo valor da causa ultrapasse 500 salários mínimos, ações que possam gerar inelegibilidade, e hipóteses em que o acórdão recorrido contraria jurisprudência dominante do STJ.

Se o seu caso se encaixa em uma dessas hipóteses, destaque isso em letras garrafais. “O presente caso possui relevância presumida nos termos do art. 105, § 3º, inciso X, da CF/88, pois o valor da causa excede 500 salários mínimos”. Isso facilita o trabalho do admissor, que já vai ticar o requisito da relevância como cumprido.

Conhecer essas hipóteses de presunção é vital para a estratégia processual. Se o seu caso não se encaixa nelas, o ônus argumentativo sobre você é muito maior. Portanto, tenha a Constituição atualizada sempre à mão e use essas “vias rápidas” de admissibilidade a seu favor sempre que possível.


Quadro Comparativo: Onde estamos pisando?

Para que você visualize melhor a posição do Recurso Especial no ecossistema recursal, preparei este quadro comparando-o com seus “vizinhos” mais próximos. Entender a função de cada “produto” jurídico evita que você use a ferramenta errada para o trabalho.

CaracterísticaRecurso Especial (RESP)Recurso Extraordinário (RE)Agravo em Recurso Especial (AREsp)
Tribunal de DestinoSTJ (Superior Tribunal de Justiça)STF (Supremo Tribunal Federal)STJ (destrava o REsp na origem)
Violação AtacadaLei Federal Infraconstitucional (Cód. Civil, CPC, Leis esparsas)Constituição Federal (Artigos da CF/88)Decisão da Presidência do TJ/TRF que inadmitiu o REsp
Requisito ChaveRelevância da Questão Federal (Novo) + PrequestionamentoRepercussão Geral + PrequestionamentoImpugnação Específica de TODOS os fundamentos da decisão de inadmissão
Súmula “Vilã”Súmula 7 (Não reexamina fatos/provas)Súmula 279 (Não reexamina fatos/provas)Súmula 182 (Falta de ataque específico aos fundamentos)
Objetivo PrincipalUniformizar a interpretação da Lei FederalGuardar a Constituição FederalForçar a subida do Recurso Especial para análise do STJ

Meu caro, advogar nos Tribunais Superiores é para quem tem estômago forte e atenção aos detalhes. Evitar esses 5 erros (e agora você conhece mais do que 5) não garante a vitória no mérito, mas garante que você tenha a chance de lutar. A admissibilidade é a porta do castelo; se você não souber a senha, ficará do lado de fora gritando, não importa quão nobre seja sua causa. Use essas diretrizes, humanize sua técnica, mas seja rigoroso com a forma. Boa sorte no seu próximo recurso!

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