Progressão de Regime: O Caminho para a Liberdade
Você já parou para pensar como funciona o retorno gradual de um condenado à sociedade? O sistema penal brasileiro não foi desenhado para trancar alguém e jogar a chave fora, mas sim para promover a reintegração passo a passo. É aqui que entra a figura central da nossa conversa de hoje: a progressão de regime.[1] Se você tem um familiar preso ou simplesmente quer entender as regras do jogo, precisa dominar esse conceito. A liberdade não acontece de um dia para o outro; ela é conquistada em etapas, com regras matemáticas e comportamentais muito claras.
Neste artigo, vamos dissecar o funcionamento desse mecanismo previsto na Lei de Execução Penal (LEP). Você vai entender a diferença prática entre estar no fechado, no semiaberto e no aberto, e por que a mudança de um para o outro é tão crucial. Não se trata apenas de mudar de prédio ou de cela. Trata-se de mudar a forma como o Estado vigia o indivíduo e o quanto de confiança é depositada nele para viver entre nós novamente.[1] Vamos explorar os requisitos que o juiz analisa e o que pode travar esse processo.
Além disso, vou te explicar as “pegadinhas” que costumam atrasar a vida de quem busca esse benefício. Muitas vezes, o cálculo do tempo está certo, mas um detalhe no comportamento ou uma falta disciplinar antiga acaba travando tudo. Como advogado experiente, já vi muitos casos onde a falta de atenção aos detalhes custou meses de liberdade. Prepare-se para uma aula prática, direta e sem o “juridiquês” desnecessário que só serve para confundir. Vamos ao que interessa.
Entendendo o Sistema Progressivo Brasileiro
O Brasil adota o que chamamos de sistema progressivo de cumprimento de pena.[1][2] Isso significa que a punição começa mais severa e vai se tornando mais branda conforme o condenado demonstra que está apto a voltar ao convívio social.[1][3][4] A lógica é simples: você não solta alguém que passou anos isolado diretamente na rua sem um período de adaptação. É como um mergulhador que precisa subir à superfície devagar para não sofrer com a descompressão. A progressão é essa subida gradual, testando a responsabilidade do apenado em cada estágio.
Essa estrutura é um direito do preso, não um favor do juiz. Se os requisitos estiverem preenchidos, a lei manda que o Estado conceda a mudança para um regime mais leve.[1] No entanto, o sistema é rígido quanto à ordem das coisas. Você começa no regime fixado na sentença e vai descendo os degraus de severidade.[4][5][6] O objetivo final é sempre a ressocialização, ou seja, devolver para a sociedade um cidadão melhor ou, pelo menos, que não volte a cometer crimes. Se o sistema falha nisso na prática, é outra discussão, mas a teoria jurídica que você precisa usar a seu favor é essa.
É fundamental que você entenda que a progressão depende de mérito. O tempo passa para todos, mas o comportamento é individual. O sistema progressivo premia quem segue as regras e pune quem as quebra, podendo inclusive fazer o caminho inverso, a chamada regressão. Portanto, a progressão não é automática apenas pelo calendário. Ela exige uma postura ativa de cumprimento das normas carcerárias, trabalho e estudo.[3] Sem essa contrapartida, as portas dos regimes mais brandos permanecem trancadas.
O que é a progressão de regime?
A progressão de regime é a transferência do apenado de um regime mais rigoroso para outro menos rigoroso.[1][3][4][5][6][7][8][9] Na prática, é sair de um local com muros altos e guardas armados para um local onde a vigilância é menor e o senso de responsabilidade própria é maior. É o instituto jurídico que materializa a esperança de liberdade dentro do cárcere. Sem ela, a pena seria apenas um castigo eterno até o último dia, o que geraria revoltas constantes e nenhum incentivo para o bom comportamento lá dentro.
Para você visualizar melhor, imagine uma escada. O topo da escada é a liberdade plena. O degrau mais baixo é o regime fechado. A progressão é o ato de subir um degrau de cada vez. Você não pode pular degraus (salvo exceções raríssimas de falta de vagas que veremos adiante), e você precisa provar que tem equilíbrio para ficar no degrau de cima. É um benefício que altera a forma de execução da pena, mas não extingue a pena. O indivíduo continua devendo ao Estado, mas paga essa dívida com mais autonomia.
Juridicamente falando, a progressão está prevista no artigo 112 da Lei de Execução Penal.[2][8][10][11] Ela é o motor que faz a execução penal andar. Sem progressão, o sistema travaria por superpopulação ainda mais rápido do que já trava. Ela serve como ferramenta de gestão da massa carcerária e como instrumento pedagógico. Você mostra ao condenado que o bom comportamento traz recompensas tangíveis e imediatas, como poder sair para trabalhar ou visitar a família em datas festivas, dependendo do regime alcançado.
A finalidade da ressocialização na pena[1][2][3][4]
A palavra “ressocialização” é bonita no papel, mas o que ela significa para o seu caso? Significa que o juiz vai analisar se você ou seu familiar tem condições de viver em sociedade sem cometer novos crimes. A progressão é o teste prático dessa teoria. Quando o Estado permite que alguém vá para o semiaberto, ele está dizendo: “acredito que você já aprendeu parte da lição e não vai fugir na primeira oportunidade”. É um voto de confiança gradual.[4]
O sistema entende que longos períodos de encarceramento total podem desumanizar a pessoa e retirar dela a capacidade de convívio. Por isso, a progressão tenta reinserir o indivíduo aos poucos.[1] No semiaberto, o contato com o mundo externo aumenta. No aberto, ele é quase total. Esse processo visa evitar o choque cultural de sair da prisão após anos e não saber como pegar um ônibus ou lidar com a liberdade de ir e vir. A ressocialização, portanto, é o norte que guia a decisão do juiz ao conceder ou negar o benefício.
Você deve usar esse argumento em seus pedidos. Mostre que o apenado está trabalhando, estudando, participando de cultos religiosos ou atividades culturais dentro do presídio. Tudo isso são provas de ressocialização. Não basta apenas não brigar; é preciso mostrar evolução. O advogado experiente sabe que o processo de execução penal é um dossiê da vida do preso. Quanto mais recheado de atividades positivas for esse dossiê, mais fácil convencer o juiz de que a finalidade da pena está sendo cumprida.
A proibição do salto de regime (Súmula 491 STJ)[1][3]
Existe uma regra de ouro no direito penal brasileiro: não se pode pular etapas. Isso é conhecido como a vedação à progressão per saltum (por salto).[1] Você não pode sair do regime fechado diretamente para o aberto, ignorando o semiaberto.[1][3][4] O Superior Tribunal de Justiça (STJ) até editou a Súmula 491 para deixar isso cristalino. A lógica é que o teste de adaptação precisa ser completo. Se o preso não passou pelo semiaberto, não provou que tem autodisciplina suficiente para o aberto.
Muitos clientes me perguntam: “Doutor, mas eu já cumpri tempo suficiente para o aberto, por que tenho que ir para o semiaberto?”. A resposta é a lei.[3][4] Mesmo que o cálculo matemático permita um salto teórico, a vivência prática é obrigatória. O sistema quer ver como você se comporta com uma vigilância intermediária antes de te dar a chave de casa. Queimar etapas seria um risco para a sociedade e para o próprio apenado, que poderia não estar preparado para tanta liberdade repentina.
No entanto, há uma exceção prática importante que você deve conhecer. Se o Estado não tiver vaga no regime semiaberto, ele não pode manter o preso no fechado prejudicando-o por uma falha estatal. Nesse caso, a jurisprudência (Súmula Vinculante 56 do STF) permite que o preso aguarde a vaga em um regime mais benéfico, como o aberto ou prisão domiciliar com tornozeleira. Mas atenção: isso não é progressão por salto oficial; é uma medida de emergência pela falha do Estado. A regra geral continua sendo: degrau por degrau.
Os Três Regimes de Cumprimento de Pena[1][2][3][4][5]
Agora vamos destrinchar o “cardápio” de regimes. O Código Penal estabelece três modalidades principais: Fechado, Semiaberto e Aberto.[2][4][5] Cada um tem suas regras arquitetônicas e disciplinares. Saber exatamente o que é permitido e proibido em cada um evita frustrações e punições desnecessárias. Muitos problemas na execução penal surgem porque o preso acha que o semiaberto é “bagunça” e acaba cometendo faltas que o mandam de volta para o fechado.
A diferença fundamental entre eles está no grau de vigilância. No fechado, a vigilância é máxima e constante. No semiaberto, ela é média e focada na disciplina coletiva. No aberto, a vigilância é mínima e baseada quase inteiramente na autodisciplina e no senso de responsabilidade do condenado. O Estado vai se retirando de cena e deixando o indivíduo assumir o controle de suas ações.
Você precisa entender que a estrutura física dos presídios no Brasil varia muito. O que a lei diz ser uma “Colônia Agrícola” pode ser, na prática, um galpão superlotado. Por isso, conhecer a teoria é vital para exigir que a realidade se aproxime o máximo possível do direito. Se o local onde seu familiar está não atende aos requisitos mínimos do regime dele, há medidas jurídicas para pedir a transferência ou até a domiciliar.
Regime Fechado: Segurança máxima e média[3][5]
O regime fechado é o início da jornada para condenações acima de 8 anos ou para reincidentes.[5] Aqui, o cumprimento da pena ocorre em estabelecimento de segurança máxima ou média.[3][5] Estamos falando de celas individuais ou coletivas, muros altos, grades reforçadas e vigilância armada 24 horas. O preso tem sua liberdade de locomoção restrita ao interior do presídio e aos horários de banho de sol.
Nesse regime, o trabalho é permitido e incentivado, mas apenas dentro do estabelecimento prisional, durante o dia, com isolamento noturno.[5] O trabalho externo é admissível apenas em obras ou serviços públicos, e mesmo assim, sob escolta direta e com restrições severas (máximo de 10% dos presos da obra). A ideia é manter o controle total sobre o indivíduo, minimizando qualquer risco de fuga ou contato não monitorado com o mundo exterior.
Para o advogado e para a família, o regime fechado é o momento de maior atenção. É onde o preso está mais vulnerável às tensões do cárcere e onde é mais difícil conseguir remição de pena por trabalho, devido à escassez de vagas. O foco aqui deve ser manter a boa conduta a todo custo e buscar qualquer oportunidade de estudo ou leitura (remição pela leitura) para abreviar esse período o mais rápido possível. Cada dia remido conta para sair desse ambiente opressor.
Regime Semiaberto: Colônias agrícolas e industriais[3][5]
O semiaberto é o regime intermediário. É destinado a condenados não reincidentes com pena entre 4 e 8 anos, ou para quem progrediu do fechado.[4][5] A execução ocorre em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar.[3][5] A grande diferença visual é a ausência de muralhas gigantescas e guardas armados em cada esquina. A segurança existe, mas é menos ostensiva. O preso dorme em alojamentos coletivos, e não em celas trancadas individualmente.
A chave do semiaberto é o trabalho. Aqui, o apenado pode trabalhar fora do presídio durante o dia, sem escolta direta, desde que tenha autorização judicial e carta de emprego. Ele sai de manhã e volta à noite para dormir. Além disso, é nesse regime que surgem as famosas “saidinhas” temporárias (visita à família, feriados), que são fundamentais para o reatamento dos laços familiares.
O perigo do semiaberto é a falsa sensação de liberdade total. Como a vigilância é menor, a tentação de cometer pequenos desvios (usar celular, beber álcool na rua voltando do trabalho) é grande. E qualquer deslize aqui é fatal: configura falta grave e causa a regressão para o fechado. Você deve orientar o apenado de que o semiaberto é um teste de confiança. Se trair essa confiança, o Estado não hesita em trancá-lo novamente.
Regime Aberto: Casa de albergado e realidade prática[4][5]
O regime aberto deveria ser cumprido em Casa de Albergado. Pela lei, é um local sem grades, onde o condenado apenas pernoita e passa os finais de semana, trabalhando livremente durante o dia. É destinado a penas iguais ou inferiores a 4 anos ou para quem progrediu do semiaberto.[5] Baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade.
Porém, aqui entra a realidade brasileira: quase não existem Casas de Albergado no país. Por falta desses estabelecimentos, a jurisprudência consolidou que o regime aberto é cumprido, na prática, em Prisão Domiciliar. O condenado vai para casa, mas deve seguir regras estritas: estar em casa em determinado horário (geralmente das 22h às 6h), não frequentar bares, não se ausentar da cidade sem autorização e comparecer mensalmente ao fórum para assinar presença.
Para você, isso soa como liberdade total, mas juridicamente ainda é pena. Se o condenado for pego na balada de madrugada ou viajar para a praia sem avisar o juiz, ele pode perder o benefício e voltar para o semiaberto ou fechado. O regime aberto é uma “liberdade vigiada”. O Estado não está vendo, mas se descobrir o descumprimento, a punição é severa. É o estágio final antes do término da pena ou do livramento condicional.
Requisitos para a Concessão do Benefício[6][10]
Não basta querer, tem que merecer e tem que ter tempo. A progressão de regime é um binômio: Requisito Objetivo (tempo) + Requisito Subjetivo (comportamento).[2][3][4][8] Você precisa preencher os dois simultaneamente.[8] Não adianta ter comportamento de santo se não cumpriu o tempo mínimo, e não adianta ter cumprido a pena inteira se o comportamento for péssimo (embora, nesse último caso, a pena acabe terminando).
O juiz da Vara de Execuções Penais (VEP) é quem decide. Ele pega a calculadora para ver a data e pega o atestado de conduta para ver o comportamento. Se os dois estiverem “ok”, ele defere a progressão. Parece simples, mas a burocracia atrapalha. Muitas vezes o atestado demora a chegar ou o cálculo de pena está desatualizado no sistema.
O seu papel é fiscalizar isso. Se o tempo já bateu, o pedido tem que ser feito imediatamente. Cada dia a mais no regime mais gravoso é um dia de liberdade roubado pelo Estado ineficiente. Vamos entender como calcular isso e o que realmente significa “bom comportamento” na visão dos tribunais.
Requisito Objetivo: O cálculo da pena (Frações vs Porcentagens)
Antigamente, a conta era fácil: 1/6 da pena para crimes comuns e 2/5 ou 3/5 para hediondos. Mas o Pacote Anticrime (Lei 13.964/19) mudou tudo e introduziu um sistema de porcentagens que vai de 16% a 70%. Isso gerou uma confusão enorme e você precisa saber qual lei se aplica ao caso. Se o crime foi antes de 2020, usa-se a regra antiga (frações) se for mais benéfica. Se foi depois, usa-se a tabela de porcentagens.
Por exemplo: para um réu primário em crime sem violência, a exigência é 16% da pena cumprida. Se for reincidente em crime sem violência, 20%. Se for crime hediondo primário, 40%. Se for hediondo com morte, 50% (vedado livramento).[4] A tabela é complexa e exige análise caso a caso. Você precisa pegar a guia de execução penal e ver a data do fato e a natureza do crime.
O cálculo é matemático puro. Se a pena é de 10 anos e o requisito é 16%, o preso precisa cumprir 1 ano, 7 meses e alguns dias. Erros de cálculo são comuns nos tribunais. Sempre refaça as contas. Não confie cegamente no cálculo automático do sistema do tribunal (como o SEEU). Advogados diligentes encontram dias e até meses de diferença que antecipam a saída do cliente.
Requisito Subjetivo: O atestado de boa conduta carcerária[3][4][7][8][10]
O tempo abre a porta, mas o comportamento é quem permite atravessá-la. O requisito subjetivo é a “boa conduta carcerária”.[3][4][7][8][10] Quem atesta isso é o diretor do presídio.[8] Ele emite um documento dizendo se o preso teve faltas disciplinares, se trabalha, se respeita os agentes. Sem esse papel, o juiz não decide.
O problema é que “bom comportamento” é um conceito vago. Para a lei, basta não ter cometido falta grave nos últimos 12 meses (ou período similar dependendo da jurisprudência local). Faltas leves e médias antigas geralmente são relevadas (reabilitadas). O diretor não pode negar o atestado por antipatia pessoal; ele precisa basear-se nos registros disciplinares oficiais.
Se o atestado vier negativo (“má conduta”), a progressão é negada. Mas você pode questionar isso. O mau comportamento precisa ser provado através de Processo Administrativo Disciplinar (PAD). Se o diretor diz que o preso é “ruim” mas não há nenhum PAD formalizado, essa avaliação é subjetiva demais e ilegal. A defesa deve exigir fatos concretos, não opiniões.
O impacto do Pacote Anticrime (Lei 13.964/19)[1][2]
O Pacote Anticrime endureceu o jogo. Ele acabou com a progressão de 1/6 para muitos casos e criou patamares mais altos para crimes violentos e hediondos. Antes, um condenado por crime hediondo primário cumpria 2/5 (40%). Agora continua 40%, mas a lei detalhou tantas hipóteses que para reincidentes e crimes com morte, a exigência subiu muito.
Outra mudança crucial foi para quem integra organização criminosa ou milícia: a barra subiu, exigindo mais tempo de cadeia. O Pacote também vetou a saída temporária para condenados por crime hediondo com resultado morte (embora haja discussões recentes sobre a validade retroativa disso). O cenário ficou mais rígido.
Porém, nem tudo foi ruim. O Pacote trouxe clareza para algumas situações que antes ficavam no “limbo” da interpretação dos juízes. Ao definir porcentagens exatas, reduziu a margem para arbitrariedades. O importante é saber: a lei penal não retroage para prejudicar.[3][8] Se o crime foi antes de 2020, as regras novas e mais duras não se aplicam ao seu cliente. Ele tem direito às regras antigas (1/6, etc.), que geralmente são melhores.
O Exame Criminológico e a Polêmica Atual[11]
Recentemente, a discussão sobre o exame criminológico voltou com força total. Antes obrigatório para quase todos, a lei mudou para torná-lo facultativo, e agora novas leis tentam trazê-lo de volta como regra. O exame é uma avaliação feita por psiquiatras, psicólogos e assistentes sociais para “prever” se o preso vai voltar a delinquir. É uma bola de cristal científica (e muitas vezes falha).
O problema é a demora. Um exame desses pode levar meses para ser agendado, travando a progressão de quem já tem o direito. Além disso, muitas vezes é feito em 15 minutos de entrevista, gerando laudos padronizados que não refletem a realidade do indivíduo. Como advogado, vejo isso como um gargalo processual imenso.
Se o juiz pedir o exame, você tem que ficar atento.[5][10] O pedido precisa ser fundamentado.[10] O juiz não pode pedir “apenas por ser crime grave”. Ele tem que dizer: “peço o exame porque o preso teve tal comportamento estranho no dia tal”. Sem fundamentação concreta, o pedido do exame é ilegal e pode ser derrubado via Habeas Corpus para destravar a progressão.
A natureza facultativa vs. obrigatória do exame
A Lei 14.843/2024 trouxe alterações recentes tentando ampliar a exigigatoriedade do exame, mas a interpretação majoritária dos tribunais superiores (STF e STJ) historicamente sempre foi de que ele é facultativo. A regra é o atestado de boa conduta do diretor.[3][8][10] O exame criminológico é a exceção para casos complexos.
Quando o exame se torna uma barreira burocrática automática, ele viola o princípio da individualização da pena. Não se pode tratar o ladrão de galinha e o serial killer da mesma forma exigindo perícia complexa para ambos. O sistema não tem peritos suficientes. Torná-lo obrigatório para todos significa paralisar as progressões por falta de estrutura estatal.
Você deve brigar pela desnecessidade do exame se o crime não for de altíssima complexidade ou violência extrema. Argumente que o bom comportamento atestado pelo diretor (que convive com o preso há anos) vale mais do que uma entrevista de 20 minutos com um psicólogo que nunca viu o apenado antes. A vivência diária é o melhor exame criminológico que existe.
O que é avaliado pelos peritos (psicólogos e assistentes sociais)
Os peritos buscam sinais de arrependimento, agressividade latente, planos para o futuro e suporte familiar. Eles perguntam sobre o crime: “Por que você fez isso?”. Se o preso responde de forma evasiva ou culpa a vítima, ganha pontos negativos. Eles querem ouvir que o sujeito assumiu a responsabilidade e tem um plano concreto de vida honesta (trabalho, família) lá fora.
A assistente social vai verificar se a família vai acolher o preso. Ter um endereço fixo e alguém esperando é fundamental. O psicólogo vai testar a maturidade emocional. O psiquiatra (se houver) vai buscar patologias. É um check-up da mente e da vida social do indivíduo.
A dica para o cliente é: honestidade e serenidade. Tentar manipular os peritos geralmente sai pela culatra. Eles são treinados para detectar mentiras. O preso deve focar no futuro, no que vai fazer para trabalhar e ajudar a família, e não ficar remoendo o passado ou reclamando da justiça durante a entrevista. Foco na ressocialização.
Como a defesa pode impugnar um laudo desfavorável
Se o laudo vier dizendo “não recomendado”, não é o fim da linha. O laudo é uma opinião técnica, não uma sentença. O juiz não é obrigado a seguir o perito, embora quase sempre siga. A defesa pode contratar um assistente técnico para fazer um contra-laudo ou apontar falhas no laudo oficial (ex: entrevista muito curta, perguntas tendenciosas, conclusões sem base científica).
Você pode argumentar que o laudo se baseou apenas na gravidade do crime cometido anos atrás, e não na evolução atual do preso. O que importa para a progressão é o homem de hoje, não o de 10 anos atrás. Se o laudo só fala do passado, ele é imprestável para avaliar o requisito subjetivo atual.
Além disso, impugne laudos que usam termos vagos como “agressividade contida” ou “imaturidade”. Exija fatos. Se o preso não brigou em 5 anos de cadeia, de onde o psicólogo tirou que ele é agressivo? Confronte a teoria do perito com a realidade dos fatos carcerários. A realidade deve prevalecer.
Falta Grave e suas Consequências na Progressão[1][2][4][5][8][10][11]
A falta grave é o pesadelo da execução penal. Ela zera o cronômetro. Se o preso comete uma falta grave (tentar fugir, ter celular, agredir alguém, portar drogas), ele não só vai para o “castigo” (isolamento), como perde parte dos dias remidos e reinicia a contagem do tempo para a progressão de regime.
Isso significa que se faltava 1 mês para ir para o semiaberto e ele é pego com um chip de celular, a contagem recomeça do zero a partir da data da falta. Ele vai ter que cumprir a fração (16%, 40%, etc.) tudo de novo sobre o restante da pena. É um atraso de anos na vida do condenado.
Você precisa orientar a família: não levem coisas proibidas. Não incentivem comportamentos de risco. O preço pago por um momento de rebeldia ou conforto ilegal é a liberdade a longo prazo. A disciplina é a moeda de troca mais valiosa dentro do sistema prisional.
O que configura falta grave segundo a LEP
A lista está no artigo 50 da LEP. As mais comuns são: fugir, possuir celular ou acessórios, desobedecer ordem direta, incitar motim e cometer novo crime doloso. Atenção: a posse de acessórios de celular (carregador, fone, chip) é tão grave quanto ter o aparelho completo. A jurisprudência é pacífica nisso.
Outra pegadinha: a recusa ao trabalho obrigatório também é falta grave. O preso não pode escolher não trabalhar se houver vaga e aptidão. Subverter a ordem e a disciplina também entra no pacote. São conceitos abertos que dão muito poder aos agentes penitenciários.
É vital que qualquer acusação de falta grave seja apurada com rigor. Muitas vezes, um “desacato” foi apenas uma resposta ríspida a um tratamento desumano. A defesa deve atuar para desclassificar a conduta para falta média ou leve, que não reiniciam a contagem do tempo de progressão.
A interrupção do prazo (data-base) para progressão
Cometeu falta grave? A data-base muda.[4] A nova data para começar a contar os 16% ou 40% passa a ser o dia da infração. Todo o tempo cumprido antes da falta serviu apenas para extinguir pena, mas não serve mais para a conta da progressão. É o efeito “Sísifo”: você rola a pedra até quase o topo, e ela rola tudo para baixo de novo.
Isso só afeta a progressão. Para o livramento condicional e para o indulto, a Súmula 535 do STJ diz que a falta grave não interrompe o prazo. Essa é uma distinção técnica crucial. Se seu cliente teve falta grave, ele vai demorar para progredir de regime, mas talvez o livramento condicional dele ainda esteja no prazo. Fique atento a essa estratégia alternativa.
O recálculo deve ser feito sobre a pena restante na data da falta, e não sobre a pena total original. Isso atenua um pouco o prejuízo, mas ainda é um golpe duro na expectativa de liberdade.
O procedimento administrativo disciplinar (PAD) e o direito de defesa
Nenhuma punição pode ser aplicada sem defesa. A falta grave exige um PAD. O preso deve ser ouvido, ter advogado constituído ou defensor público presente na audiência disciplinar dentro do presídio. Se não tiver defesa técnica, o PAD é nulo e a falta grave cai.
Muitos diretores aplicam a falta “de caneta” sem fazer o PAD formal. Isso é ilegal. O juiz da execução não pode homologar a falta grave e reiniciar o prazo se não houver o procedimento administrativo prévio e regular. A defesa deve pedir a nulidade da decisão se o rito não foi seguido.
No PAD, você pode ouvir testemunhas, pedir imagens de câmeras e confrontar a versão dos agentes. É um mini-julgamento. Ganhar no PAD significa salvar anos de liberdade do seu cliente. Não negligencie essa fase administrativa; ela é tão importante quanto o processo judicial.
Comparativo: Progressão de Regime vs. Outros Benefícios[8]
Para te ajudar a visualizar onde a Progressão se encaixa, preparei este quadro comparativo com outros dois institutos muito comuns na execução penal que costumam confundir os familiares.
| Característica | Progressão de Regime | Livramento Condicional | Prisão Domiciliar |
| O que é? | Mudança de degrau (Fechado > Semi > Aberto).[1][3][4][5][6][7] | Liberdade antecipada (fim da prisão). | Cumprimento da pena em casa (excepcional ou Regime Aberto).[3][4][5] |
| Vigilância | Gradual (Alta > Média > Baixa). | Mínima (período de prova). | Média/Baixa (geralmente com tornozeleira). |
| Requisito Tempo | Frações menores (ex: 16%, 1/6). | Frações maiores (ex: 1/3, 1/2, 2/3). | Depende (Doença grave, falta de vagas ou Regime Aberto).[5] |
| Efeito da Falta Grave | Interrompe a contagem do tempo (zera). | Não interrompe a contagem do tempo. | Pode revogar o benefício e voltar para a cadeia. |
| Principal Vantagem | Prepara o preso aos poucos para a rua. | É a “liberdade” antes do fim da pena. | Humanitária (saúde) ou prática (falta de vaga). |
Entender essas diferenças é vital. Às vezes, seu cliente perdeu a progressão por uma falta, mas já tem tempo para o Livramento Condicional. O jogo da execução penal é dinâmico e exige olhar para todo o tabuleiro. Mantenha-se informado, exija os direitos e lembre-se: a liberdade é a regra, a prisão é a exceção.
