Violência Psicológica: O Crime Silencioso e Seus Direitos
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Violência Psicológica: O Crime Silencioso e Seus Direitos[1]

Você já sentiu que estava enlouquecendo dentro da sua própria casa? Aquela sensação de que tudo o que você fala é distorcido, de que suas memórias estão erradas e de que você não é boa o suficiente? Se isso soa familiar, precisamos ter uma conversa séria. Muitas vezes, as cicatrizes mais profundas não são aquelas deixadas na pele, mas as que ficam na alma.

A violência psicológica é ardilosa.[2] Ela não deixa olho roxo, não quebra braço e, por isso, a sociedade tende a diminuir a gravidade do que você está passando. “Ele só estava nervoso”, dizem. Mas, no mundo jurídico, a conversa mudou. Hoje, temos ferramentas poderosas para proteger sua integridade mental e emocional.

Vou te explicar aqui, de forma clara e direta, como a lei brasileira enxerga essa agressão invisível. Vamos deixar de lado o “juridiquês” complicado e focar no que realmente importa: a sua proteção e a garantia dos seus direitos. Você não está louca e, definitivamente, não está sozinha nessa batalha.

Entendendo a Violência Psicológica na Lei 14.188/2021[1][2][3][4][5][6][7][8][9]

O que diz o Artigo 147-B do Código Penal[3][5][6][7][8][10][11][12]

A legislação brasileira deu um passo gigantesco com a Lei 14.188 de 2021.[9] Antes, ficávamos num limbo jurídico, tentando encaixar ofensas verbais em crimes menores como ameaça ou injúria. Agora, o jogo virou. O artigo 147-B do Código Penal tipifica especificamente a violência psicológica contra a mulher.[3][5][6][7][12] Não é mais apenas um “ilícito civil” ou uma “falta de educação”. É crime, com pena de reclusão.[5][6][9][10][11][12]

A lei define essa violência como causar dano emocional que prejudique o pleno desenvolvimento da mulher.[4][5][6][8][9][10] Isso inclui degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões.[1][4][5][6][8][9][11] Perceba a amplitude disso. Se alguém controla o que você veste, para onde vai ou no que acredita, mediante ameaça ou constrangimento, essa pessoa está cometendo um crime.[5][6][9] A lei veio para nomear o que antes era tratado como “briga de casal”.[3]

A pena prevista é de seis meses a dois anos de reclusão, além de multa.[3][5][6][9][10] Pode parecer pouco à primeira vista, mas a existência desse tipo penal específico muda tudo na hora de pedir uma medida protetiva. O juiz agora tem base legal concreta para afastar o agressor, mesmo que ele nunca tenha encostado um dedo em você. A violência contra a psique foi equiparada, em gravidade de reconhecimento, à violência física.[1]

A diferença entre conflito conjugal e crime

Essa é a dúvida número um que recebo no escritório. “Doutor, mas toda discussão é violência psicológica?” A resposta é um sonoro não. Conflitos, divergências de opinião e até discussões acaloradas fazem parte da convivência humana. O que diferencia uma briga normal de um crime é a intencionalidade de subjugar, controlar e ferir o outro emocionalmente de forma sistemática.

No conflito conjugal saudável, existe uma troca, mesmo que ríspida, de pontos de vista. Na violência psicológica, existe uma hierarquia imposta. Um manda, o outro obedece por medo ou exaustão. Existe um padrão de comportamento focado na desestabilização.[1][3][6][9][13] O agressor quer que você duvide de si mesma para que ele possa exercer poder sobre suas escolhas.

Juridicamente, analisamos a habitualidade e o dolo (a intenção). Uma ofensa isolada no calor do momento, embora reprovável, raramente configura o crime do 147-B. O crime se desenha na repetição, na tortura “gota a gota” que minam a autoestima da vítima até que ela não consiga mais reagir. É essa sistemática de anulação da personalidade que buscamos provar no processo.

A invisibilidade e o dano emocional permanente[1][2][3][10][13]

O maior inimigo da vítima de violência psicológica é a invisibilidade. Como não há marcas roxas, amigos e familiares muitas vezes minimizam a situação. “Ele é um bom provedor”, dizem os vizinhos. Isso gera uma segunda camada de violência: o isolamento social. Você começa a achar que o problema é você, já que ninguém mais parece ver o monstro que ele se torna dentro de casa.

Os tribunais estão cada vez mais atentos aos laudos técnicos que demonstram o nexo causal entre a convivência com o agressor e o desenvolvimento de transtornos. Depressão, ansiedade generalizada e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) são sequelas comuns. O dano emocional prejudica sua capacidade de trabalhar, de ser mãe e de viver plenamente.

A lei fala em “prejuízo à saúde psicológica e autodeterminação”.[4][5][6][8] Isso significa que, se o comportamento dele fez você abandonar sua carreira, se afastar da sua família ou desenvolver síndrome do pânico, o crime se consumou. O bem jurídico tutelado aqui é a sua sanidade e a sua liberdade de ser quem você é. A justiça não pode e não vai ignorar a dor que não sangra, mas que mata a alma aos poucos.

Como Identificar o Agressor: Sinais de Alerta

Gaslighting: A manipulação da sua sanidade[3]

Você já ouviu falar em gaslighting? É um termo importado, mas a prática é velha conhecida nos lares brasileiros. É aquela situação onde você confronta o parceiro sobre algo que ele fez, e ele inverte o jogo tão habilmente que você termina a conversa pedindo desculpas. Ele diz: “Você está louca, isso nunca aconteceu” ou “Você é muito sensível, está imaginando coisas”.

Essa tática é cruel porque ataca a sua percepção da realidade. O objetivo do agressor é fazer você duvidar da sua própria memória e sanidade.[3] Com o tempo, você para de confiar nos seus instintos. Você se torna dependente da “versão” dele para entender o mundo. Juridicamente, isso é uma forma clara de manipulação prevista no tipo penal da violência psicológica.

Identificar o gaslighting é o primeiro passo para a libertação. Comece a anotar os fatos. Mantenha um diário. Quando ele disser “eu nunca disse isso”, você terá seu registro. Essa manipulação é uma forma de tortura mental que visa anular sua capacidade de defesa. O juiz precisa entender que essa confusão mental não é natural, mas sim fabricada pelo agressor.

Controle financeiro e isolamento social

Muitas vezes, a violência psicológica vem de mãos dadas com a violência patrimonial.[14] O controle das finanças é uma forma eficadíssima de manter alguém refém. Ele critica seus gastos, confisca seu cartão ou te impede de trabalhar fora. A mensagem subliminar é: “Sem mim, você não sobrevive”. Isso gera uma dependência forçada que te impede de romper o ciclo.

O isolamento social segue a mesma lógica. Ele começa criticando sua mãe, depois suas amigas. “Sua amiga coloca ideias na sua cabeça”, ele diz. Aos poucos, para evitar brigas, você deixa de ver as pessoas que ama. Quando você percebe, seu mundo se resume a ele. E é exatamente isso que ele quer: que você não tenha rede de apoio para pedir socorro.

Para a justiça, cercear o direito de ir e vir ou limitar o contato com familiares configura grave violação.[9] A lei é clara ao citar “limitação do direito de ir e vir” e “isolamento” como condutas criminosas.[5] Se você precisa pedir permissão para visitar sua família ou para gastar o dinheiro que você mesma ganhou, acenda o sinal vermelho. Isso não é cuidado, é cárcere emocional.

Ameaças veladas e chantagem emocional

Nem toda ameaça é “eu vou te matar”. As ameaças veladas são até mais comuns na violência psicológica. “Se você se separar, nunca mais vê as crianças”, “Se você sair por essa porta, eu me mato”, ou “Ninguém vai te querer velha e com dois filhos”. Essas frases são punhais que paralisam a vítima pelo medo ou pela culpa.

A chantagem emocional usa seus sentimentos nobres contra você. Ele sabe que você é uma boa mãe, então ataca sua maternidade. Ele sabe que você preza pela família, então ameaça destruir a reputação do lar. O agressor joga com o seu medo do escândalo e da perda. Ele se coloca como vítima (“olha o que você me faz fazer”) para justificar a própria agressividade.

No tribunal, tratamos isso como constrangimento ilegal e ameaça. Ameaçar tirar a guarda dos filhos sem base legal é uma forma de terrorismo psicológico. Ameaçar suicídio para prender a parceira é abuso emocional severo. Você precisa saber que essas ameaças, na maioria das vezes, são blefes de um covarde que teme perder o controle sobre sua “propriedade”.

Produção de Provas: O Desafio Jurídico

Prints, áudios e a ata notarial

Como provar o que acontece entre quatro paredes? Esse é o “pulo do gato” na advocacia criminal. A palavra da vítima tem muito peso, sim, mas precisamos blindá-la com evidências. Hoje, o WhatsApp é o maior produtor de provas contra agressores. Mensagens ofensivas, áudios gritando, históricos de chamadas insistentes… tudo isso é ouro para a sua defesa.

Mas cuidado: um simples “print” pode ser contestado.[4] A defesa dele vai dizer que foi montagem. Por isso, a ferramenta mais robusta é a Ata Notarial. Você vai ao cartório, entrega o celular ao tabelião, e ele certifica num documento oficial que aquelas mensagens existem e vieram daquele número. Esse documento tem fé pública. É difícil para qualquer juiz ignorar uma ata notarial bem feita.

Gravações ambientais também são válidas. Você pode gravar uma conversa da qual participa, mesmo que ele não saiba. “Doutor, mas isso não é grampo ilegal?” Não. Grampo é quando terceiro grava. Você gravar sua própria conversa para provar um crime é legítimo defesa. Tenha o gravador do celular sempre à mão. Essas provas materiais transformam o “ele disse, ela disse” em fatos incontestáveis.

A importância do laudo psicológico e médico

O corpo fala, e a mente também. Se você faz terapia, o relatório do seu psicólogo é uma prova técnica fundamental. O profissional pode atestar que você apresenta sintomas compatíveis com quem sofre abuso crônico. Ele não precisa dizer “Fulano bateu nela”, mas pode dizer “A paciente apresenta quadro de estresse pós-traumático decorrente de dinâmica conjugal abusiva”.

Além disso, procure médicos se houver sintomas físicos decorrentes do estresse (queda de cabelo, gastrite, insônia severa). Prontuários médicos formam um histórico. Mostram que sua saúde deteriorou ao longo do relacionamento.[2] Isso ajuda a estabelecer o nexo causal que mencionei anteriormente. Não negligencie sua saúde, e use a busca por tratamento como forma de documentar o dano sofrido.

A perícia oficial do Estado também pode ser solicitada. Em muitos casos, pedimos que a vítima seja avaliada por peritos do tribunal ou do IML (setor psiquiátrico). Esses laudos oficiais têm peso fortíssimo na condenação. Eles são frios, técnicos e imparciais. Um laudo apontando dano psíquico é a materialidade do crime do artigo 147-B estampada no processo.[3][8][11][12]

Testemunhas em crimes cometidos na clandestinidade

Crimes domésticos geralmente não têm plateia. O agressor costuma ser um “anjo” na rua e um demônio em casa. Por isso, a prova testemunhal tem particularidades. Quem são suas testemunhas? Geralmente não são pessoas que viram a agressão, mas que viram o efeito da agressão em você.

Vizinhos que ouviram gritos ou barulhos de objetos quebrando são valiosos. Porteiros que presenciaram você chorando ou ele chegando alterado também. Amigas para quem você desabafou logo após os fatos podem depor como “testemunhas de ouvir dizer” ou para atestar sua mudança de comportamento. “Ela era alegre, de repente parou de sair e vivia amedrontada”.

Não subestime o que as pessoas ao redor percebem. Muitas vezes, a vítima acha que ninguém sabe, mas o isolamento e a tristeza são visíveis. Colegas de trabalho que notaram sua queda de rendimento podem ajudar a compor o quadro probatório. O nosso trabalho como advogados é costurar esses depoimentos periféricos para criar um mosaico que revele a verdade ao juiz.

Medidas Protetivas e a Atuação Policial Imediata

O afastamento do lar sem agressão física[3]

Um mito perigoso que precisamos derrubar agora: “Só posso tirar ele de casa se ele me bater”. Isso é mentira. A Lei Maria da Penha e a nova legislação de violência psicológica permitem o afastamento do lar baseado no risco à integridade psicológica.[6] Se a convivência se tornou insuportável e perigosa para sua mente, o Estado deve intervir.

Ao chegar na delegacia, você deve narrar os fatos com ênfase no medo e na coação. O delegado pode requerer, e o juiz deferir, que ele saia de casa imediatamente, levando apenas os pertences pessoais. A casa fica com você e as crianças. Essa medida visa cessar a agressão contínua. Não espere o primeiro tapa para buscar esse direito.

A medida protetiva de urgência (MPU) costuma sair rápido, muitas vezes em 24 ou 48 horas. Ela proíbe que ele se aproxime, que faça contato por qualquer meio e que frequente lugares onde você está. É o “freio de arrumação” necessário para que você consiga respirar e planejar os próximos passos sem o terror psicológico diário ao seu lado.

O descumprimento de medidas e a prisão

O papel aceita tudo, mas e a realidade? Se ele descumprir a medida, o que acontece? O descumprimento de medida protetiva é, por si só, um novo crime (Art. 24-A da Lei Maria da Penha). E o mais importante: é um crime que autoriza a prisão preventiva imediata. Não tem fiança na delegacia para isso.

Se ele mandar uma mensagem no WhatsApp depois de intimado da proibição de contato: print e delegacia. Se ele rondar seu trabalho: ligue 190. A polícia tem o dever de atuar. O sistema judiciário não tolera afronta à sua autoridade. Quando o agressor desobedece uma ordem judicial, ele não está desafiando só você, está desafiando o Estado. E o Estado costuma responder com algemas.

Você precisa ser firme na fiscalização. Não “deixe passar” uma ligação ou uma visita rápida. O ciclo da violência se aproveita dessas brechas. Cada vez que você permite a aproximação após a medida, a defesa dele usa isso para dizer que “eles reataram” ou que “ela não tem medo dele”. Seja rigorosa. A sua segurança depende dessa linha que não pode ser cruzada.

Como agir na delegacia (O registro do BO)

Ir à delegacia é intimidante. O ambiente é pesado, e infelizmente, nem todo policial tem o preparo ideal. Minha dica de advogado: vá acompanhada, se possível, de um advogado ou de uma pessoa de extrema confiança. Leve tudo organizado: prints impressos, áudios num pen drive, lista de testemunhas com endereço e telefone.

Ao relatar, seja cronológica e específica. Evite dizer apenas “ele me humilha”. Diga: “No dia tal, ele disse isso e aquilo; no dia tal, ele quebrou meu celular”. Detalhes dão credibilidade. Insista para que o crime seja tipificado como Violência Psicológica (147-B) e não apenas ameaça ou injúria. Peça expressamente as Medidas Protetivas de Urgência no final do depoimento.

Se sentir que o atendimento está sendo negligente, que estão tentando te desencorajar (“ah, isso é briga de marido e mulher, volta pra casa”), mantenha a calma e exija falar com a autoridade policial (o delegado). Você tem o direito de ser atendida em sala reservada, preferencialmente por policial feminina. Não saia de lá sem o protocolo do BO e o pedido de medidas formalizado.

Aspectos Cíveis e a Reconstrução da Vida[13]

Indenização por danos morais e materiais[14]

A justiça não é só prender; é também reparar. O agressor mexeu com sua cabeça e, muitas vezes, com seu bolso. É perfeitamente cabível pedir indenização por danos morais na esfera cível ou até mesmo dentro do processo criminal. O STJ já tem entendimento consolidado de que a violência doméstica gera dano moral in re ipsa, ou seja, presumido. Não precisa provar a dor, apenas o fato.

Se ele quebrou seus objetos, rasgou suas roupas ou usou seu dinheiro indevidamente, cabe dano material. Guarde notas fiscais, extratos bancários. A reconstrução da sua vida passa pela autonomia financeira. Não tenha vergonha de cobrar cada centavo que foi subtraído ou destruído. Isso não é vingança, é justiça patrimonial.

Muitas mulheres abrem mão disso para “se livrar logo dele”. Entendo o sentimento, mas pense no seu futuro. Esse dinheiro pode ser a base para você alugar um novo apartamento, fazer um curso ou pagar terapia. Converse com seu advogado sobre cumular os pedidos. O agressor precisa sentir no bolso o custo de suas ações violentas.

Impacto na guarda dos filhos e alienação parental

Esse é o ponto mais sensível. Agressores psicológicos adoram usar filhos como escudo ou arma. Mas a lei está do seu lado. A guarda compartilhada, que é a regra geral, pode e deve ser afastada em casos de violência doméstica. Não faz sentido obrigar você a conviver e tomar decisões conjuntas com quem te violenta psicologicamente.

O juiz da vara de família, ao saber da medida protetiva e do processo criminal, deve priorizar a segurança do lar materno. Além disso, fique atenta à alienação parental. Se ele fala mal de você para as crianças, tenta destruir sua imagem de mãe, isso é alienação e também violência psicológica contra os filhos.

Proteja seus pequenos. O ambiente tóxico adoece as crianças, mesmo que ele não grite diretamente com elas. Elas absorvem a tensão. Relatórios da escola e de psicólogos infantis são fundamentais aqui. A justiça prioriza o “melhor interesse da criança”, e viver num ambiente de terror psicológico nunca é o melhor interesse delas.

Divórcio e partilha de bens em cenários de abuso

Sair de um casamento abusivo é uma fuga de campo minado. No divórcio, é comum que ele tente esconder bens, esvaziar contas ou dizer que você não tem direito a nada porque “não trabalhou”. Não caia nessa conversa. O regime de bens vale independente da conduta dele, mas a estratégia processual muda.

Em casos de violência, podemos pedir o divórcio liminar (imediato), antes mesmo de discutir a partilha. O importante é romper o vínculo jurídico o quanto antes. Sobre os bens, podemos pedir bloqueio de contas e arrolamento de bens se houver suspeita de que ele está dilapidando o patrimônio para te prejudicar.

Não assine nada sem ler. Não aceite acordos de boca feitos sob pressão. O momento da separação é quando a violência psicológica costuma escalar, pois ele sente que está perdendo o controle. Deixe que os advogados briguem. Você cuida de você. O processo de divórcio deve ser a porta de saída para uma vida onde a única voz que guia suas decisões é a sua.

CaracterísticaViolência Psicológica (Art.[1][2][3][4][5][8][9][10][12][13][14][15] 147-B CP)Injúria (Art.[3][5][6][7][10][11][12] 140 CP)Maus-tratos (Art. 136 CP)
Foco da CondutaDano emocional, controle, manipulação e degradação contínua.[1][5][6][8][9][13]Ofensa à dignidade ou decoro (xingamento pontual).Abuso nos meios de correção/disciplina ou privação de cuidados.[3][6][9]
ContextoGeralmente relação de afeto/doméstica, com habitualidade e intenção de subjugar.Pode ocorrer entre desconhecidos ou conhecidos, muitas vezes num ato isolado.Relação de subordinação (pais/filhos, tutores), focado no excesso punitivo.
Bem JurídicoSaúde psicológica e autodeterminação da mulher.[1][3][4][5][6][8]Honra subjetiva (o que a pessoa pensa de si).Vida e saúde (física ou psíquica) de quem está sob guarda.[1][2][3][6]
PenaReclusão de 6 meses a 2 anos + multa.[3][5][6][9][10]Detenção de 1 a 6 meses ou multa.[9][10]Detenção de 2 meses a 1 ano ou multa.

A Dinâmica Processual e a Revitimização

O depoimento especial e a oitiva sem danos

Uma das maiores preocupações do sistema de justiça moderno é evitar a revitimização. O que é isso? É fazer você reviver o trauma repetidas vezes, contando a mesma história dolorosa para o porteiro da delegacia, o escrivão, o delegado, o promotor e o juiz. É uma tortura institucional. Para combater isso, temos lutado pela implementação de depoimentos especiais e salas acolhedoras.

No processo, você tem o direito de ser ouvida sem a presença do agressor. Ele é retirado da sala de audiência ou a oitiva é feita por videoconferência. Você não precisa olhar na cara de quem te destruiu emocionalmente para dizer a verdade. Se o juiz não oferecer isso espontaneamente, seu advogado deve exigir. É uma prerrogativa legal para garantir a fidedignidade do seu relato e sua saúde mental.

O papel do Ministério Público na acusação

Você não está processando ele sozinha. Nos crimes de violência psicológica, quem “compra a briga” é o Estado, representado pelo Ministério Público (MP). O Promotor de Justiça é o titular da ação penal. Isso significa que, mesmo que você fique com pena ou medo e queira “retirar a queixa”, na maioria das vezes, o processo continua. O Estado entende que a violência doméstica é um problema público, não privado.

O promotor vai analisar as provas, pedir condenação e fiscalizar a aplicação da lei. É fundamental manter contato com a promotoria, fornecendo elementos novos sempre que surgirem. Veja o MP como um aliado poderoso. Eles têm a força institucional para pedir prisões e medidas mais duras que, às vezes, o advogado particular tem dificuldade de emplacar sozinho.

A assistência de acusação como reforço necessário[14]

Apesar do MP ser o titular, eu sempre recomendo que a vítima tenha seu próprio advogado atuando como “assistente de acusação”. O promotor tem mil processos; seu advogado tem o foco no seu caso. O assistente de acusação trabalha lado a lado com o promotor, mas com um olhar voltado exclusivamente para os seus interesses, inclusive na reparação financeira.

Ter um advogado constituído garante que nenhum prazo será perdido, que as perguntas certas serão feitas nas audiências e que recursos serão interpostos se a pena for branda demais. É uma camada extra de proteção. Num crime tão complexo e subjetivo quanto a violência psicológica, ter alguém técnico traduzindo sua dor para a linguagem jurídica faz toda a diferença entre a absolvição por “falta de provas” e a condenação justa.

Estratégias de Defesa e Reconstrução Civil

O planejamento de segurança antes da denúncia

Para encerrar, um conselho prático de quem já viu muitos casos: planeje sua saída. Se você ainda está coabitando com o agressor, a ruptura é o momento mais perigoso. Antes de anunciar que vai sair ou denunciar, reúna documentos. Tire cópias de identidade, certidões de nascimento, documentos da casa e do carro. Guarde num lugar seguro, fora de casa (na casa de uma amiga ou no trabalho).

Tenha uma reserva de dinheiro, se possível. Mude suas senhas de redes sociais e e-mail. Desative a localização do celular. Prepare uma “bolsa de emergência” com roupas e itens básicos caso precise sair às pressas. Esse planejamento estratégico não é paranoia; é sobrevivência. Quando você denuncia preparada, a chance de recaída ou de ser pega desprevenida diminui drasticamente.

A violência psicológica é um labirinto, mas tem saída. A lei é o mapa, o advogado é o guia, mas a força para dar o primeiro passo vem de você. Acredite na sua percepção. O que você vive não é amor, é abuso. E para o abuso, a resposta é a lei, o limite e o recomeço. Você tem o direito de viver sem medo, e a justiça brasileira, com todas as suas falhas, nunca esteve tão preparada para te ajudar a garantir isso como está agora.

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